Estudando O Livro dos Espíritos (6)

Francisco Muniz

As Leis Morais - Lei de Destruição


1 - Destruição necessária e destruição abusiva

Conforme a lei da Natureza, é preciso que tudo se destrua para renascer e se regenerar, pois a isso que chamamos destruição não passa de uma transformação, que tem por fim a renovação e a melhoria dos seres vivos. O instinto de destruição indica que as criaturas de Deus são instrumentos de que Ele se serve para o alcance de seus objetivos. Para se alimentarem, os seres vivos se destroem entre si, com o duplo objetivo de manter o equilíbrio na reprodução, que poderia tornar-se excessiva, e de utilizar os despojos do envoltório exterior. Esse envoltório é simples acessório, e não a parte essencial do ser pensante; só ele sofre a destruição. A parte essencial é o princípio inteligente, que não se pode destruir e se elabora nas diversas metamorfoses por que passa.

Para evitar que a destruição ocorra antes do tempo necessário, a Natureza oferece-nos os meios de preservação e conservação. Toda destruição antecipada entrava o desenvolvimento dos princípio inteligente. Foi por isso que Deus concedeu a cada ser vivo a necessidade de viver e de se reproduzir. O homem, portanto, deve procurar prolongar sua vida, para cumprir sua tarefa, razão pela qual tem instintivo horror pela morte. Esse instinto é o da conservação, que o sustenta nas provas, caso contrário o homem se entregaria ao desânimo. O instinto é a voz secreta que o faz repelir a morte, dizendo que ele ainda pode fazer algo por seu progresso. O perigo que o ameaça é uma advertência para que aproveite o tempo que Deus lhe concede; no entanto, o homem, ingrato, rende graças mais vezes à sua estrela que a seu Criador.

Ao lado dos meios de conservação, a Natureza também coloca os agentes da destruição, representando o remédio ao lado do mal, para manter o equilíbrio e servir de contrapeso. A necessidade de destruição, porém, é proporcional ao estado mais ou menos material dos mundos e deixa de existir quando o físico e o moral se acham mais depurados. Nos mundos mais adiantados do que a Terra, as condições de existência são completamente diferentes. No homem, a necessidade de destruição se enfraquece à medida que o Espírito domina a matéria. É por isso que o horror à destruição aumenta com o desenvolvimento intelectual e moral. No estado atual, o direito do homem de destruição sobre os animais é regulado pela necessidade de prover ao seu sustento e à sua segurança, porque o abuso nunca foi um direito.

Desse modo, a caça e outros meios de destruição que visam o prazer sem utilidade indica predominância da bestialidade sobre a natureza espiritual. Toda destruição excessiva é uma violação da lei de Deus. Os animais só destroem para satisfação de suas necessidades, enquanto o homem, dotado de livre-arbítrio, destrói sem necessidade, tendo que prestar conta do abuso da liberdade que lhe foi concedida, porque cedeu aos maus instintos. Porém, o excessivo escrúpulo no tocante à destruição dos animais, embora louvável em si mesmo, torna-se abusivo e seu mérito acaba neutralizado por abusos de toda sorte. Entre povos que se comportam assim, há mais temor supersticioso que verdadeira bondade.

2 - Flagelos destruidores

Para fazer a Humanidade progredir mais depressa, Deus a castiga com tais flagelos, uma vez que a destruição é necessária para a regeneração moral dos Espíritos, que em cada nova existência sobem mais um degrau na escala da perfeição. São flagelos em virtude do julgamento pessoal do homem, que só enxerga os prejuízos materiais causados. Muitas vezes esses transtornos são necessários para que mais depressa se chegue a uma ordem melhor de coisas e para que se realize em alguns anos o que demoraria séculos. Diariamente, porém, Deus utiliza outros meios de melhorar a Humanidade, tendo dado ao homem o conhecimento do bem e do mal. No entanto, o homem não se aproveita desses meios e é preciso então que ele seja castigado em seu orgulho e sinta a própria fraqueza.

Observaremos justiça nesses flagelos, nos quais sucumbem tanto o homem de bem quanto o perverso, se deixarmos de referir tudo ao corpo. Após a morte, será outra a maneira de pensar, considerando que a vida do corpo é bem pouca coisa, uma vez que um século na Terra é um relâmpago na eternidade. Desse modo, os sofrimentos de alguns meses ou de alguns dias nada representam - eis um ensinamento que será útil no futuro. Os Espíritos, que preexistem e sobrevivem a tudo, constituem o mundo real; são eles os filhos de Deus e o objeto de toda sua solicitude. Os corpos são simples disfarces com que eles aparecem no mundo. Nas grandes calamidades que dizimam os homens, o panorama é semelhante ao de um exército cujos soldados, durante a guerra, ficaram com os uniformes estragados, rotos ou perdidos. O general se preocupa mais com seus soldados do que com os uniformes deles.

E ainda que as pessoas atingidas por flagelos sejam consideradas vítimas, se observássemos a vida qual ela é, e como é insignificante em relação ao infinito, não lhe daríamos tanta importância. Numa outra existência, essas vítimas encontrarão larga compensação a seus sofrimentos, se souberem suportá-lo sem reclamar. Assim é que tais flagelos destruidores são úteis, do ponto de vista físico, não obstante suas consequências trágicas, mudando algumas vezes as condições de uma região, embora o bem resultante só seja percebido pelas gerações futuras. São, portanto, provas que dão ao homem oportunidade de exercitar a inteligência, de demonstrar paciência e resignação ante a vontade de Deus, permitindo-lhe manifestar seus sentimentos de abnegação, de desinteresse e de amor ao próximo, caso o egoísmo não o domine. 

O homem, contudo, tem o poder de afastar parcialmente esses tormentos, mas não como geralmente o entendem, porque muitos flagelos resultam de sua imprevidência. À medida que ele adquire conhecimentos e experiência, pode afastá-los, isto é, preveni-los, se souber pesquisar suas causas. Porém, entre os males que afligem a Humanidade, há os de caráter geral, que estão nos desígnios da Providência e dos quais cada indivíduo recebe, em maior ou menor grau, o contragolpe. O homem nada pode opor a esse tipo de flagelo, a não ser submeter-se à vontade de Deus. Além disso, muitas vezes esses males são agravados pela negligência do próprio homem.

3 - Guerras

É a predominância da natureza animal sobre a espiritual, bem como a satisfação das paixões, o que leva o homem à guerra. No estado de barbárie, os povos só conhecem o direito do mais forte, daí por que, para eles, a guerra é um estado normal. À medida que o homem progride, a guerra se torna menos frequente, porque ele evita suas causas e quando a julga necessária sabe adicionar-lhe humanidade. A guerra desaparecerá da Terra quando os homens compreenderem a justiça e praticarem a lei de Deus. Nessa época, todos os povos se irmanarão. É com o objetivo de fomentar o progresso e a liberdade que a Providência torna a guerra necessária. Assim, a momentânea escravização resultante da guerra objetiva oprimir os povos e fazê-los progredir mais depressa. Mas aquele que promove a guerra em benefício próprio é o culpado verdadeiro e precisará de muitas existências para expiar todos os assassínios dos quais foi a causa, respondendo por cada homem cuja morte tenha causado para satisfazer sua ambição.

4 - Assassínio

O mal do assassinato é o corte ou interrupção de uma existência de expiação ou de missão, de modo que o assassínio é um grande crime. Entretanto, Deus é justo e julga mais a intenção que o fato, de modo que o assassínio nem sempre tem o mesmo grau de culpabilidade. Mas só a necessidade pode desculpar o assassinato, em casos de legítima defesa. Se o agredido puder preservar sua vida sem atentar contra a do agressor, deve assim proceder. Durante a guerra, porém, o homem não é culpado quando constrangido pela força a matar, mas é culpado pelas crueldades que comete, assim como será levado em conta seu sentimento humanitário. Todo crime é um crime, de modo que tanto o parricídio quanto o infanticídio são condenáveis aos olhos de Deus. Como o desenvolvimento intelectual não implica a necessidade do bem, o Espírito superior em intelectualidade também pode ser mau. Aquele que muito tem vivido sem se melhorar, apenas sabe. Assim se explica que o infanticídio (aborto inclusive) seja um costume consagrado pela legislação entre alguns povos intelectualmente adiantados.

5 - Crueldade

É a crueldade o que o instinto de destruição tem de pior. Se algumas vezes a destruição é uma necessidade, a crueldade não o é jamais, porque resulta sempre de uma natureza má. Nos povos primitivos, a matéria domina sobre o Espírito, razão por que a crueldade é sua característica predominante. Eles se entregam aos instintos animais, e como não têm outras necessidades além da vida do corpo, só cuidam da conservação pessoal, o que geralmente os torna cruéis. Além disso, os povos de desenvolvimento imperfeito estão sob o domínio de Espíritos igualmente imperfeitos, que lhes são simpáticos, até que povos mais adiantados venham destruir ou enfraquecer essa influência. 

A crueldade, contudo, não resulta da ausência de senso moral, porque ele existe, em princípio, na maioria dos homens, apenas não está desenvolvido. Mais tarde, esse senso moral fará com que os homens cruéis se tornem seres bons e humanos. O senso moral, portanto, existe no selvagem, mas nele está como o princípio do perfume no gérmen da flor que ainda não desabrochou. Do mesmo modo que numa árvore carregada de bons frutos, encontram-se alguns estragados, no seio de uma civilização mais adiantada há às vezes seres tão cruéis quanto os selvagens. São, se quisermos, selvagens que da civilização só têm a aparência, agindo como lobos extraviados em meio de cordeiros. 

Espíritos de ordem inferior e muito atrasados podem encarnar entre homens adiantados, na expectativa de também se adiantarem; contudo, se a prova for muito pesada, vai predominar a natureza primitiva. Entretanto, a Humanidade progride e esses seres, em que o instinto do mal predomina e que se acham deslocados entre pessoas de bem, desaparecerão gradualmente, como o mau grão se separa do bom, depois que este é peneirado, só que para renascer com outro envoltório. Um exemplo disso está nas planta e nos animais que o homem tem conseguido aperfeiçoar, desenvolvendo neles qualidades novas. Assim, só depois de muitas gerações o aperfeiçoamento se torna completo. É a imagem das diversas existências do homem.

6 - Duelo

O duelo é um assassínio e um costume absurdo, digno dos bárbaros. Com uma civilização mais adiantada e mais moralizada, o homem compreenderá que o duelo é tão ridículo quanto os combates que antigamente se consideravam como o juízo de Deus. E é um suicídio quando aquele que, conhecendo a própria fraqueza, tem quase certeza de que sucumbirá, sento tanto suicídio quanto um assassínio quando as possibilidades de morrer são as mesmas. Desse modo, o valor daquilo que se chama "ponto de honra" é orgulho e vaidade, duas chagas da Humanidade, em matéria de duelo. Dependendo dos usos e costumes, porém, há casos em que a honra se acha verdadeiramente empenhada e em que uma recusa ao duelo seria uma covardia. Cada país e cada século tem a esse respeito um modo de ver diferente. Quando os homens forem melhores e mais adiantados em moral, compreenderão que o verdadeiro ponto de honra está acima das paixões terrenas e que não é matando, nem se deixando matar, que reparação uma falta.

7 - Pena de morte

Incontestavelmente, a pena de morte desaparecerá da legislação humana e sua supressão assinalará um progresso da Humanidade. Quando os homens estiverem mais esclarecidos, a pena capital será completamente abolida da Terra. Os homens não terão mais necessidade de serem julgados pelos homens, mas essa ainda é uma época muito distante de nós. Embora a lei de conservação dê ao homem o direito de preservar sua própria vida, é equivocado o uso desse direito para eliminar da sociedade um membro perigoso, porque há outros meios de se preservar do perigo, sem matar. Aliás, é preciso abrir ao criminoso a porta do arrependimento, e não fechá-la.

Ainda que a pena de morte venha a ser banida das sociedades civilizadas, é inexato pensar que ela tenha sido uma necessidade em épocas menos adiantadas. O homem julga uma coisa necessária sempre que não encontra outra melhor. À medida que se esclarece, vai compreendendo melhor o que é justo ou injusto e repudia os excessos cometidos nos tempos de ignorância, em nome da justiça. Não se pode duvidar que a restrição dos casos em que se aplica a pena de morte seja um indício de progresso da civilização. Prova disso é que nos revoltamos ao ler relatos das carnificinas humanas que antigamente se faziam em nome da justiça, e muitas vezes pra honrar a Divindade. Ou das torturas a que eram submetidos os condenados, e mesmo os acusados, para lhes arrancar, por meio de sofrimentos atrozes, a confissão de um crime que muitas vezes não cometeram. Se tivéssemos vivido naqueles tempos, teríamos achado isso muito natural e, como juízes, talvez agíssemos do mesmo modo.

Assim, o que parecia justo numa época parece bárbaro em outra. Só as leis divinas são eternas, as leis humanas modificam-se com o progresso e continuarão a mudar, até que se harmonizem com as leis divinas. Ademais, o homem se equivoca quanto ao sentido de certas palavras, como esta frase de Jesus: "Quem matou pela espada, morrerá pela espada", achando que ela consagra a lei de talião, de modo que a pena de morte imposta ao assassino seria a aplicação dessa lei. Devemos ter cuidado com interpretações assim! A pena de talião é a justiça de Deus; é Ele quem a aplica. Todos os homens sofrem essa pena a cada instante, pois somos punidos naquilo em que houvermos pecado, nesta vida ou em outra.

Aquele que provoca o sofrimento de seus semelhantes virá a achar-se numa condição em que sofrerá o que tenha feito sofrer os outros. É este o sentido das palavras de Jesus. Mas ele também disse: "Perdoai aos vossos inimigos", assim como ensinou-nos a pedir a Deus que perdoe nossas ofensas como nós mesmos houvermos perdoados, isto é, na mesma proporção em que tivermos perdoado. Isso é o que temos de compreender. Aqueles que pensam em impor a pena de morte em nome de Deus desejam tomar o lugar dele na aplicação da justiça, mostrando o quão longe estão de compreender a Divindade e o quanto tem a expirar. A pena de morte é um crime, quando aplicada em nome de Deus, e os que a impõem se tornam responsáveis por esses assassínios.

Comentários

  1. Obrigada amigo pela oportunidade de refletir sobre a vida e sermos fiéis a Divindade e esses momentos nos ensinando como viver bem a cada dia.
    Jesus lhe ilumine hoje e sempre

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    1. Assim seja! Sigamos aprendendo. Obrigado pela visita e pelas palavras estimulantes.

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