Os herdeiros do Senhor

Francisco Muniz



Nas páginas do Evangelho, toda vez que a palavra Senhor aparece, principalmente referida por Jesus, ela representa Deus, o Pai criador, na relação com seus filhos, os quais devem se ver sempre como servidores.

Geralmente, essas narrativas apresentam dois filhos, simbolizando as duas principais características observadas nos Espíritos criados pela Divindade: os bons e os maus, porquanto somos todos filhos do mesmo Pai.

Em pelo menos duas parábolas contadas por Jesus esses dois filhos têm papel preponderante e peculiar, demonstrando a ilimitada complacência e inesgotavel misericórdia que o Senhor manifesta para com todos.

Não pode ser diferente, porque, como diz o profeta Ezequiel em seu livro do Velho Testamento, Deus não quer a morte do ímpio, quer que ele se converta, ou seja, que cumpra sua soberana Vontade.

Na Parábola dos Dois Filhos, por exemplo, o Cristo explicita esse convite ao mostrar o Senhor da Vinha (o mundo é uma imensa plantação) chamando seus dois filhos ao trabalho de transformação das paisagens íntimas.

O primeiro filho disse não querer esse trabalho, depois se arrepende de sua negação e atende ao apelo paterno. O outro, porém, afirmara que compareceria à tarefas, mas jamais se fez presente, deixando claro que sua atitude contrariava o solicitude paterna.

Já na Parábola do Filho Pródigo clarifica-se a questão da herança. Somos todos herdeiros da Divindade, que nos cumula de recursos para bem vivermos, com a condição de estarmos sempre atentos à necessidade de muitiplicarmos esses bens para proveito geral.

O chamado filho pródigo, em vez de usar bem a parte que lhe coube da herança, optou por delapidar esses recursos e sofreu por isso. Entretanto, em seu coração ele sabia que o Senhor, sempre magnânimo, poderia diminuir e aplacar as dores que sua incúria provocou.

Isso de fato aconteceu, mas o Senhor, nessa parábola, tem um outro filho que não ficou satisfeito com o tratamento diferenciado que seu Pai dedicou ao irmão relapso. Também ele, com tal atitude, demonstrou não estar em condições para administrar sua parte da herança, pela simples queixa enciumada, fruto do desnecessário julgamento.

Em termos proporcionais, é como nos encontramos neste momento, o que me leva a recordar o amigo Antonio Carlos que conheci num asilo de idosos. Esse amigo, antugo professor de Filosofia, disse já haver lido toda a Bíblia. Ao saber disso, eu quis fazer uma gracinha com ele e perguntei:

- Se você já leu tanto o Velho quanto o Novo Testamento, diga-me: com quem fica a herança?

Antonio Carlos não pestanejou e respondeu:
- Com o testamenteiro!

E o testamenteiro é aquele encarregado pelo Senhor pela repartição da herança, mediante os critérios da boa administração. E nele, portanto, reconhecemos o Cristo, através do cujos ensinamentos poderemos ter sucesso em nossa jornada de aperfeiçoamento moral e chegarmos, um dia, à pretendida união com o Pai, como há mais de dois mil anos nos propõe Jesus.

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