Estudando O Livro dos Espíritos (4)

Francisco Muniz 


Leis Morais - Lei de Conservação

1 - Instinto de conservação

Sendo o instinto de conservação uma lei da Natureza, todos os seres vivos o possuem, seja qual for p grau de sua inteligência. Em alguns, ele é puramente mecânico, enquanto é racional em outros. Deus concedeu esse instinto  todos o seres vivos porque todos devem concorrer para p cumprimento dos desígnios da Providência - é a própria necessidade de viver. Além disso, a vida é necessária ao aperfeiçoamento dos seres, que amiúde não se dão conta dessa tarefa.

2 - Meios de conservação

Porque o homem tem necessidade de viver, naturalmente, Deus lhe faculta desde sempre os meios para isso, e se ele não encontra esses meios é que não os compreende. Deus não podia dar ao homem a necessidade de viver sem lhe conceder os recursos indispensáveis. É por essa razão que faz a Terra produzir o necessário a todos os seus habitantes, visto que só o necessário é útil, ao contrário do supérfluo. Nem sempre, porém, a terra produz bastante para garantir o necessário ao homem, mas é porque, ingrato, ele a despreza. A terra é mãe excelente e o homem muitas vezes acusa a Natureza daquilo que é resultado de sua imperícia ou imprevidência. A produção do necessário seria suficiente se o homem soubesse contentar-se com o necessário. Se não fosse aplicado no supérfluo o que poderia ser empregado no necessário, a produção da terra bastaria a todas as necessidades. A Natureza não é imprevidente, o homem é que não sabe moderar seu modo de viver.

Deve-se ao egoísmo dos homens o fato de a alguns indivíduos faltarem os meios de subsistência, mesmo quando a abundância os cerca. Os egoístas nem sempre fazem o que devem. Na maioria das vezes, contudo, a culpa está mesmo nos indivíduos que não buscam com ardor e perseverança, e não com indolência, aquilo que desejam e de que têm necessidade, sem se deixarem desanimar pelos obstáculos, que são, muitas vezes,  simples meios de experimentar a constância, a paciência e a firmeza dos necessitados.

Assim, pois, há mais merecimento em sofrer todas as provações da vida com coragem e abnegação em vez de sacrificar os semelhantes para matar a fome. Em casos assim, há homicídio e crime de lesa-natureza, falta que deve ser duplamente punida. E há mundos onde os seres vivos, ainda que precisem alimentar-se, têm seu alimento de acordo com a própria natureza e este não seria bastante substancial para os estômagos grosseiros dos povos da Terra, do mesmo modo como o deles não poderiam digerir o que comemos aqui.

3 - Gozo dos bens terrenos

O uso dos bens da Terra é um direito de todos os homens, sendo consequência da necessidade de viver. Deus não imporia um dever sem dar ao homem o meio de cumpri-lo. Desse modo, Ele pôs atrativos no gozo desses bens, para estimular o homem ao cumprimento de sua missão e também experimentá-lo por meio da tentação, que tem o objetivo de desenvolver-lhe a razão, que o preserva dos excessos. Esse gozo, porém, tem limites traçados, indicando até onde vai a necessidade. Entretanto, pelos excessos nós chegamos à saciedade e com isso nos punimos a nós mesmos. Desse modo, deve-se lamentar o homem que procura nos excessos de todo gênero o requinte de seus prazeres, uma atitude nada invejável que só nos aproxima da morte, tanto da física quanto da moral. 

4 - Necessário e supérfluo

O homem sensato conhece o limite do necessário por intuição, embora muitos só o conheçam à custa das próprias experiências. Ainda que a Natureza tenha traçado os limites de nossas necessidades, através de nossa própria organização física, temos sido insaciáveis e por isso os vícios alteram nossa constituição, criando necessidades ilusórias. Dessa maneira, aqueles que se apropriam dos bens da Terra para se proporcionarem o supérfluo, prejudicam a quem falta o necessário, dando mostras de desconhecerem a lei de Deus; terão, em consequência, de responder pelas privações que houverem causado aos outros.

5 - Privações voluntárias. Mortificações

Sem força e sem saúde, fica impossível ao homem prover às necessidades do corpo, trabalhando, conforme a lei de conservação o obriga. Não é censurável, portanto, procurar o bem-estar, que é um desejo natural, posto que Deus só proíbe o abuso, por ser contrário à lei de conservação. Esse bem-estar, contudo, não deve ser conseguido à custa de outras pessoas, nem às expensas das próprias forças físicas e morais. Assim, fazer o bem aos outros atrai muito mais mérito aos olhos de Deus, a exemplo da privação dos prazeres inúteis, porque liberta o homem da matéria e eleva sua alma. Meritório é resistir à tentação que induz aos excessos ou ao gozo das coisas inúteis; é o homem tirar do que lhe é necessário para dar aos que não têm o suficiente. Se a privação não passar de vão simulacro, será um escárnio.

Quanto à vida de mortificação, praticada desde a mais remota Antiguidade por diversos povos, se somente serve para quem a pratica e o impede de fazer o bem, é puro egoísmo. A verdadeira mortificação consiste em privar-se a si mesmo e trabalhar para os outros, segundo prescreve a caridade cristã. Já a respeito da alimentação, o homem tem permissão para alimentar-se de tudo o que não lhe prejudique a saúde. A proibição feita por alguns legisladores, a exemplo de Moisés, teve finalidade útil e para que suas leis tivessem autoridade eles as apresentaram como se viessem do próprio Deus. A constituição física do homem permite que a carne se alimente da carne, para evitar o perecimento. A lei de conservação impões ao homem o dever de conservar suas energias e sua saúde, para cumprimento da lei do trabalho.

A alimentação, portanto, deve ser conforme as exigências do organismo humano. Contudo, haverá mérito na abstenção da alimentação animal se o homem dela se privar, por expiação, em benefício dos outros, porque para Deus só há mortificação quando há privação séria e útil, havendo hipocrisia se essa privação é só aparente. Somente o que é útil pode agradar a Deus, que é sensível unicamente aos sentimentos que elevam a alma até Ele, razão pela qual é praticando as leis divinas, em vez de violá-las, que o homem pode sacudir o jugo da matéria terrestre.

Assim é que os únicos sofrimentos que nos elevam são os naturais, porque vêm de Deus. Os sofrimentos voluntários para nada servem, quando não concorrem para o bem dos outros. Por isso se equivocam os que abreviam a vida por meio de rigores sobre-humanos. Melhor vestir o indigente, consolar o que chora, aliviar o enfermo e privar-se em benefício dos infelizes. Não fazer essas coisas é agir egoisticamente. De acordo com os preceitos do Cristo, só se pratica a caridade quando se sofre pelos outros. Mas é valoroso precaver-nos dos sofrimentos que podemos prever ou nos ameacem, porque o instinto de conservação foi dado a todos os seres contra os perigos e os sofrimentos. Que se fustigue o espírito, portanto, e não o corpo; mortifiquemos o orgulho, sufoquemos o egoísmo, que é algo semelhante a uma serpente no coração, e faremos muito mais por nosso adiantamento, do que infligindo rigores que não são mais desta época.

Comentários

  1. Edificante essa leitura. É para refletirmos cuidadosamente.

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  2. Bela leitura. A sua compreensão nos faz agir de modo diferente.

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