As crianças de Bebé (2)

Francisco Muniz -

As crianças da Creche numa atividade recreativa



Há algum tempo, fizemos aqui um pequeno relato acerca de um de nossos encontros com a querida Bebé, nascida Isabel, que vem a ser uma da colaboradoras de minha mãe do coração no Centro Espírita Nosso Lar, em Mata de São João. Recentemente estivemos lá e ouvimos Bebé contar belas e ao mesmo tempo tristes histórias acerca das crianças de que ela cuidava quando a Creche Municipal ainda funcionava nas instalações do Centro, substituindo a Escola André Luiz e sendo uma das muitas atividades assistenciais daquela Casa iluminada. São histórias de 20 anos atrás, quando a administração municipal começava a fazer o regaste da educação, que é a marca registrada das últimas gestões.

Mata de São João, apesar de sua riqueza turística observada principalmente nas localidades da orla marítima - Imbassaí, Praia do Forte e outras localidades aprazíveis - tem uma população bastante carente em sua maioria, condição que há duas décadas era muito mais acentuada. Em razão disso, as crianças atendidas na Creche André Luiz, provenientes das camadas sociais mais necessitadas, apresentavam, não raro, preocupantes quadros de maus tratos físicos e de fome.

Bebé contou, por exemplo, o caso de uma criança que logo ao chegar comoveu a todos pela extrema fraqueza em que se encontrava, chegando ao cúmulo de desmaiar na sala de aula. Socorrida, ela implorou por comida: "Bebezinha, bote uma bolachinha na minha boca!" Prestimosas, Bebé e sua auxiliar na cozinha da creche acorreram, pressurosas, mas a criança, um menino, não tinha força nem mesmo para deglutir o leite colocado em sua boca...

Naquela época, o C. E. Nosso Lar mantinha uma clínica odontológica à disposição da comunidade carente, o que incluía também as crianças da Creche André Luiz. Foi dessa forma, contou Bebé, que se descobriu que um dos pequenos alunos - a creche-escola recebia crianças de 2 a 6 anos de idade - sofria maus tratos em casa. Levado para a sessão de limpeza dentária, o menino acusou dor ao ser colocado na cadeira do dentista e então Dr. Mateus apontou o fato a Mamãe, dirigente da instituição. Investigando-se o fato, soube-se que o pai da criança tanto batia quanto mordia as nádegas da criança.

Alguns genitores por vezes esqueciam de ir buscar seus filhos na escola e os funcionários da creche tinham muita dificuldade em encaminhar as crianças às respectivas residências. Nesses casos, perguntava-se aos meninos onde ficava a casa onde moravam e as respostas em nada ajudavam: "Minha casa fica numa rua que tem muitas casas"; ou então: "Eu moro na minha casa"; ou ainda: "Minha casa tem uma árvore". Certa vez, foi preciso levar uma das crianças até a residência, que ficava relativamente longe, na mesma rua do antigo cemitério municipal. Chegando lá, a mãe (ou avó) da criança estava sentada à porta, informando que havia chegado muito cansada do trabalho - era gari - e por isso havia esquecido de ir buscar o filho.

Com o propósito de realizar um bom trabalho junto à comunidade, alicerçado tanto no Evangelho de Jesus quanto nos postulados da Doutrina Espírita, Mamãe e seus colaboradores procuravam orientar esses pais, conversando seriamente com eles sobre a responsabilidade de criarem os filhos de modo a não vê-los desviados do bom caminho. Ainda assim, disse Bebé, alguns daqueles meninos tomaram rumos contrários às orientações recebidas, entregando-se ao crime e à morte precoce. Outros, porém, estão muito bem encaminhados e hoje são cidadãos cumpridores de seus deveres. 

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