Francisco Muniz -
O Apocalipse, ou o Livro da Revelação, retorna ao nosso
estudo de temas do Novo Testamento para subsidiar os comentários que faremos
hoje, dia 27 de junho, abordando o versículo 6 do sexto capítulo, que traz esta
epígrafe: “O Cordeiro abre os sete selos”. Eis o texto, copiado da Bíblia de
Jerusalém, que analisaremos de acordo com o aprendizado da Doutrina
Espírita:
“Ouvi então uma voz, vinda do meio dos quatro Seres
vivos, que dizia: ‘Um litro de trigo por um denário e três litros de cevada por
um denário! Quanto ao óleo e ao vinho, não causes prejuízo’.”
Por vezes, parece assustador saber que tudo que acontece na
Terra foi e está há muito previsto, porque, embora tenhamos o livre arbítrio e
a iniciativa de nossas ações, sentimo-nos, nesse aspecto, como se fôssemos meras
peças num imenso tabuleiro cósmico. Dizemos isso em razão da correspondência dessas
palavras do apóstolo João com o que se passa no mundo atualmente, em
decorrência da guerra que a Rússia declarou à Ucrânia, comprometendo o
abastecimento de grãos na Europa e em outras partes do planeta. É a ação do “terceiro
cavaleiro”, promovendo o fantasma da fome desde que os dois primeiros,
prenunciadores da guerra e da morte, saíram a campo, uma vez abertos os selos
do “livro da Vida”. Nota de rodapé na Bíblia de Jerusalém informa que o preço
do trigo e da cevada simboliza, de fato, a fome, porquanto durante a guerra o
fornecimento de víveres é racionado e os produtos ficam muito mais caros.
Curioso é que a tal voz ouvida por João pede que sejam
poupados o óleo e o vinho, o que parece remeter às grandes potências mundiais
que controlam sua produção e distribuição: no primeiro caso, os Estados Unidos,
Arábia Saudita e Rússia; no segundo, a Itália e a França. Quem tem poder, como
sabemos, dá as cartas, estabelecendo as condições de comércio de modo a
assegurar vantagens, em detrimento da segurança e do bem-estar de muitos. Entretanto,
Deus “quer” que seja assim, isto é, tal estado de coisas deverá se manter nesse
nível até que a Humanidade desperte para a realidade do Espírito imortal,
compreendendo, como interpreta Carlos Torres Pastorino em Sabedoria do
Evangelho (*), que o materialismo, aspecto doentio da realidade objetiva, é
o antissistema cujos tormentos somente o reconhecimento da instância espiritual,
que é de fato o Sistema, poderá atenuar e, depois, sobrepujar.
Essa oposição que o materialismo e seus asseclas, como o
capitalismo (o culto ao dinheiro simbolizado em Mamon), oferecem à dimensão do
Sagrado o Espiritismo a identifica desde o início e veio lhe dar combate
sugerindo ao Homem que reconheça em si mesmo tal doença e se esforce por
curar-se, corrigindo o egoísmo que o (nos) caracteriza. Para isso, torna-se
imprescindível o exercício do autoconhecimento para a necessária tarefa da
reforma íntima a que somos convidados desde dois mil anos atrás, quando o
Cristo desceu das culminâncias celestiais para visitar esta província que ora
nos abriga e estamos destruindo. Somos nós mesmos, portanto, a tal “besta do apocalipse”,
porque através de nossas paixões desenfreadas pomos a perder a oportunidade de
melhorar e conspurcamos o ambiente em que devemos nos exercitar. Felizmente,
Deus não quer a destruição, mas o aperfeiçoamento de sua obra e segue
derramando de sua inesgotável misericórdia sobre cada um de nós, seus filhos
misérrimos...
(*) Obra publicada pela Ed. Sabedoria (Rio de Janeiro, 1967) que disseca em oito volumes o ensinamento de Jesus, analisando, por comparação, o que dizem Lucas, João, Mateus e Marcos.
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