Francisco Muniz -
“(...) todo vale será aterrado, toda montanha ou colina
será abaixada; as vias sinuosas se transformarão em retas e os caminhos
acidentados serão nivelados.”
Essas palavras, retiradas da Bíblia de Jerusalém, são
do versículo 5 do terceiro capítulo do Evangelho de Lucas, iniciando a segunda
parte desse livro, intitulada “Preparação do ministério de Jesus”. Colocado sob
a epígrafe “Pregação de João Batista”, esse versículo traz o tema dos
comentários que nos propomos fazer neste dia 17 de maio, dando prosseguimento ao
estudo de algumas passagens do Novo Testamento sob a luz cristalina da Doutrina
Espírita.
Inicialmente, revelemos o que dizem as reticências: Lucas
cita um dado histórico, afirmando que o começo da pregação de Jesus, marcada
pelo batismo de João no rio Jordão, deu-se no 15º ano do governo do imperador
Tibério César, quando Pôncio Pilatos era o governador da Judeia, Herodes
reinava sobre a Galileia, seu irmão Filipe era o tetrarca da Itureia e da Traconítide,
enquanto Lisânias governava a Tetrarquia de Abilene, sendo que Anás e Caifás ocupavam
o posto de Sumo Sacerdote dos judeus. Nessa época, diz o evangelista, “a palavra
de Deus foi dirigida a João, filho de Zacarias, no deserto”, passando ele a
percorrer a região ribeirinha “proclamando um batismo de arrependimento para a
remissão dos pecados, conforme está escrito no livro das palavras do profeta
Isaías”.
O profeta anunciava a vinda do Messias, a qual seria precedida
pela ação de um arauto, figura esta identificada em João: “Voz do que clama no
deserto: preparai o caminho do Senhor, tornai retas suas veredas (...)” A
profecia se conclui no versículo 6: “E toda a carne verá a salvação de Deus”. A
Humanidade, portanto, é e será sempre a grande beneficiária do advento do
Cristo, não importa quanto tempo passe até que vejamos o mundo pacificado, as
relações harmonizadas, o planeta regenerado. Mas desde que começou a pronunciar
suas lições libertadoras do Espírito escravizado às ilusões da matéria,
propondo uma revolução moral que se encontra em pleno curso, malgrado as forças
rebeldes que lhe movem combate, já vemos o acerto das profecias de Isaías.
Com efeito, os vales da iniquidade estão sendo a pouco e
pouco aterrados, as montanhas e colinas do orgulho e do egoísmo são diminuídas,
assim como as curvas dos conceitos equivocados sofrem os golpes certeiros da
verdade e as anfractuosidades (*) do comportamento humano recebem o nivelamento
da informação imperecível: todos somos Espíritos imortais com a tarefa de
despertar com a urgência possível para essa realidade. João, portanto, indicou
como seria a tarefa do Cristo e assim deu cumprimento à sua parte, aplainando
os caminhos do Senhor, preparando a mente e o coração (a alma!) de quem o ouvia
para a imprescindível colaboração nos esforços de Jesus. É este um trabalho que
prossegue nos dias de hoje, para o qual a Terceira Revelação – o Espiritismo –
tem papel preponderante ao nos chamar para a necessária reforma íntima,
transformando os caracteres de nossa condição espiritual, aformoseando-a para
Deus.
Por essa razão é que Allan Kardec, o codificador da Doutrina
dos Espíritos, conceitua o verdadeiro espírita como “aquele que se esforça para
domar suas más inclinações” (**). Com suas palavras, o Codificador faz eco às
colocações do Espírito Paulo de Tarso na mensagem que Kardec aproveitou em O
Evangelho Segundo o Espiritismo, na qual o Apóstolo dos Gentios exalta o
lema da Doutrina – “Fora da caridade não há salvação”: “(...) fazei, pois, que
em vos vendo, possa-se dizer que o verdadeiro espírita e o verdadeiro cristão
são uma só e a mesma coisa, porque todos aqueles que praticam a caridade são os
discípulos de Jesus, qualquer que seja o culto a que pertençam” (***).
Notas
(*) Sinuosidade, tortuosidade, saliência, concavidade ou depressão
numa superfície.
(**) O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XVII (“Sede
perfeitos”), item 4 (“Os bons espíritas”).
(***) Cap. XV, item 10 das Instruções dos Espíritos.
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