Esta data no Evangelho (6 de abril)

Francisco Muniz - 



O Evangelho de João apresenta hoje, dia 6 de abril, o assunto que deveremos comentar nesta data, no prosseguimento de nosso estudo de algumas passagens do Novo Testamento. Assim, vamos destacar o versículo 6 do quarto capítulo, submetido à epígrafe “Jesus entre os samaritanos”. O texto, retirado da Bíblia de Jerusalém, narra o seguinte:

“Ali se achava a fonte de Jacó. Fatigado da caminhada, Jesus sentou-se junto à fonte. Era por volta da hora sexta.”

O docetismo é uma doutrina cristã do século II, considerada herética pela Igreja primitiva. Antecedente do gnosticismo, argumenta que o corpo de Jesus, o Messias, era uma ilusão, e que sua crucificação teria sido apenas aparente. Ao tempo de Kardec havia quem ainda defendesse tal argumento, como Jean-Batiste Roustaing (*), organizador de Os Quatro Evangelhos, obra em quatro volumes (por isso o título) psicografada por uma médium belga na qual o autor espiritual afirma que Jesus se manifestou no mundo de 2024 anos atrás com um corpo fluídico.

Homem de bom senso e dono de um caráter marcado pela prudência, tanto quanto pela coerência na defesa dos princípios doutrinários do Espiritismo, Kardec apenas noticiou, na Revista Espírita de 1866, o lançamento da obra de Roustaing, sem fazer qualquer crítica. Ora, ele não poderia ter agido de outro modo, porquanto em O Livro dos Médiuns o Codificador cede espaço ao Espírito Erasto, que fora discípulo de Paulo de Tarso, afirmando, conforme alerta de João Evangelista, que nem tudo que nos chegue dos Espíritos deve ser publicado. Diz Erasto, portanto, ser preferível recusar nove verdades a aceitar uma só mentira.

O fato é que o Nazareno, que veio ao mundo para, como afirmou, cumprir a Lei, a vontade do Pai, disseminando entre os homens a verdade do Reino de Deus, não poderia negar a si mesmo dizendo uma coisa e manifestando outra diametralmente oposta. Assim é que, para ser o guia e o modelo que a Humanidade necessita para conduzir-se no caminho do aperfeiçoamento moral, garantindo nosso crescimento espiritual, ele deveria mostrar-se como um de nós e experimentar todo tipo de padecimentos a que estamos expostos no mundo.

Parece-nos que a informação de João, que ora nos prende a atenção, joga por terra a tese docetista, porque um corpo não constituído de matéria densa, ou seja, um corpo muito mais espiritual, etéreo mesmo, mais do que físico, não acusaria cansaço ou fadiga. Para tanto, Jesus teria que ser um agênere (**). Concluímos, então, que a presença de Jesus junto ao poço de Jacó representa tanto nosso fastio das coisas mundanas quanto nossa sede de conhecimento, a qual só saciaremos se sorvermos a “água viva” de seus ensinamentos, como ele fez saber à mulher samaritana nesse mesmo local, nessa mesmíssima ocasião, conforme o relato do evangelista.

Notas

(*) Jean-Baptiste Roustaing foi advogado, jurisconsulto, bastonário da Ordem dos Advogados de Bordeaux e autor de diversos trabalhos jurídicos. Espírita francês, foi o coordenador da obra Les Quatre Évangiles – Spiritisme Chrétien ou Révélation de la Révélation, obra psicografada pela médium belga Émilie Collignon (Wikipédia).

(**) Os agêneres constituem, de acordo com a definição de Allan Kardec em O Livro dos Médiuns (FEB), “uma variedade de aparição tangível, através da qual os espíritos se revestem momentaneamente com a forma de uma pessoa viva, a ponto de fazerem completa ilusão”, ao se manifestarem no plano físico. Ver, a respeito, meu artigo “Mary Poppins era um agênere?”, disponível no blog Alma Espírita (almaespirita.blogspot.com).

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