Francisco Muniz -
Nosso estudo de algumas passagens do Novo Testamento sob a
luz meridiana do Espiritismo contempla hoje, dia 4 de abril, o quarto versículo
do capítulo 4 da Epístola de Paulo aos Romanos. Esse capítulo inicia a terceira
parte dessa Carta, intitulada “O exemplo de Abraão”, e o texto que vamos
analisar vem sob a epígrafe “Abraão justificado por sua fé”. A narrativa de
Paulo, observada na Bíblia de Jerusalém, é a seguinte:
“Ora, a quem faz um trabalho, o salário não é considerado
como gratificação, mas como um débito (...)”
Em primeiro lugar, é necessário, sempre que topamos com um
texto “quebrado”, ou incompleto, vermos o que as reticências entre parênteses
nos revelam, de modo que precisamos ir ao(s) versículo(s) seguinte(s) ou
retrocedermos ao primeiro, para conhecermos o pensamento de Paulo de Tarso. O
missivista, alcunhado de Apóstolo dos Gentios, defende a tese da justificação
pela fé e cita o primeiro Patriarca dos hebreus, afirmando que “se Abraão foi
justificado pelas obras, ele tem do que se gloriar. Mas não perante Deus”, uma vez
que a Escritura informa que “Abraão creu em Deus e isto lhe foi levado em conta
de justiça” (esta citação do Gênese (15:6) está grifada na Carta de Paulo).
Eis, portanto o que ele diz em seguida (Rom 4:5-8): “(...) a
quem, ao invés, não trabalha, mas crê naquele que justifica o ímpio, é sua fé
que é levada em conta de justiça, como, aliás, também Davi proclama a
bem-aventurança do homem a quem Deus credita a justiça, independentemente das obras”
– e cita o Salmo 32: “Bem-aventurados aqueles cujas ofensas foram perdoadas e
cujos pecados foram cobertos. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não leva
em conta o pecado”.
Entretanto, deixemos de parte essa questão, reconhecendo,
embora parcialmente, alguma razão na exposição de Paulo, e prestemos atenção no
texto do versículo destacado, bastante significativo, no qual Paulo exalta o
valor do trabalho e de sua correspondência salarial, afirmando que cada uma de
nossas atitudes beneméritas são devidamente recompensadas por Deus, através de
sua magnânima justiça. Lemos em O Livro dos Espíritos (*) que “toda
atividade útil é trabalho”, de modo que é nosso dever imprimir qualidade a tudo
quanto fazemos, uma vez considerando que não é mais importante o que fazemos do
que o modo como o fazemos.
Devemos ter em mente que o processo evolutivo começa com uma
imposição de fora para dentro – a obrigação da realização de determinadas
atividades – e continua pela imposição interna, da própria consciência, pelo
reconhecimento dos muitos deveres a cumprir, em nós mesmos e em torno de nós.
Depois, e por fim, segue pela via da vontade de querer fazer o bem acima de
tudo, a despeito de todas as circunstâncias desfavoráveis. Assim, primeiro vem o
fazer por obrigação, atitude própria daqueles ainda escravizados à matéria; depois
o fazer pelo dever, correspondente àqueles que já compreendem sua
responsabilidade; e, enfim, o fazer pelo amor incondicional ao bem.
Recordemos, a esse respeito, a observação de Jesus quanto à
ação de seus discípulos, aplicando-a a nós mesmos, relativamente ao nosso papel
de servidores do Altíssimo: “Porventura, deverá [o amo] agradecer ao escravo
porque este fez o que lhe havia mandado? Assim igualmente vós, depois de haverdes realizado tudo
quanto vos foi ordenado, dizei: ‘Somos servos inúteis, pois tão somente
cumprimos o nosso dever!’”
(*) Terceira parte, Leis Morais, questão 675.
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