Esta data no Evangelho (7 de março)

Francisco Muniz // 




Por vezes nos deparamos com um ensinamento que parece contraditório e o Evangelho é pleno de passagens cujo sentido aparentemente misterioso exige ou um grau mais apurado de nossa parte para a correta interpretação ou uma chave que facilite a compreensão – e esta é a função da Doutrina Espírita. Fazemos esse intróito em razão de nosso estudo do Novo Testamento neste dia 7 de março, quando vamos abordar o versículo 3 do capítulo 7 do Evangelho de Lucas, que traz este texto:

“Tendo ouvido falar de Jesus, enviou-lhe alguns dos anciãos dos judeus para pedir-lhe que fosse salvar o servo.”

Trata-se do centurião Cornélio, cujo servo enfermo motivou seu pedido feito a Jesus, de quem tinha ouvido falar. O Rabi se prontifica a ir à casa do militar romano e, quando já estava próximo, este interrompe sua caminhada e diz não ser digno de tal ilustre presença em sua residência, que Jesus simplesmente dê uma ordem e seu servo logo estaria curado. E Cornélio dá sua justificativa: ele também é comandante e, sem sair de seu lugar, mandava seus legionários fazerem isto ou aquilo e eles cumpriam tais ordens – e isto agradou sumamente ao Cristo, ao ponto de afirmar que jamais havia observado tão grande fé em toda Israel.

A aparente contradição observamos no episódio protagonizado pela mulher siro-fenícia, ou cananeia (Mateus 15:21-28), no qual Jesus também louva a fé dessa mãe que insistia para o Mestre curar sua filha enferma, embora ouvisse que o Messias tinha vindo unicamente para as ovelhas perdidas de Israel. Mas, de tanto insistir, ela teve seu pedido contemplado, levando-nos a considerar que o importante para o Cristo não é a participação num grupo específico, por isso merecedor de “privilégios”, mas a capacidade de manifestação da fé nos poderes da Divindade – dos quais Jesus era o representante-mor naquele momento histórico do mundo. Não eram judeus o centurião e a mulher siro-fenícia, mas, donos de uma certeza de que obteriam o de que necessitavam, apelaram para Deus, através de seu Filho, e foram satisfeitos.

Nesses dois episódios podemos notar duas maneiras de externar a fé na Divindade. A primeira é a fé pelo conhecimento: o centurião sabia, intuitiva ou conscientemente, que Jesus, como Emissário divino, tinha autoridade sobre muitos outros seres e que estes, cumprindo suas determinações, do mesmo modo como ele, Cornélio, fazia com seus subordinados, realizariam o que lhes fosse determinado. A segunda fala-nos da perseverança na busca em função do que se deseja alcançar, porquanto nossa fé também é submetida à prova, razão pela qual o Nazareno inicialmente recusa atender à mulher siro-fenícia, localizando sua missão entre os judeus, e depois despede-a anunciando a cura da filha, após louvar a grandeza de sua fé.

São grandes lições para nós que ainda titubeamos na fé, acreditando muito mais nas incertezas do mundo material do que na perenidade da vida imortal, daí resultando as manifestações da fé cega, como a crença em milagres e em fenômenos “sobrenaturais”. Ao contrário, com a Doutrina Espírita aprendemos que nossa fé precisa ser racional, isto é, ligada à razão que nos permite raciocinar acerca de tudo que nos venha ao conhecimento, cabendo-nos analisar as várias versões de um mesmo fato, a fim de podermos julgar com sabedoria as circunstâncias de cada situação em exame. Com isso evitamos ser iludidos ou sofrer decepções em nossas relações com a Divindade. Assim, como nos informa Allan Kardec, “não há fé inabalável senão aquela que pode encarar a razão face a face, em todas as épocas da Humanidade” (*).

(*) Ver O Evangelho Segundo o Espiritismo, folha de rosto.


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