Francisco Muniz //
Aberta a Bíblia de Jerusalém, eis que hoje, dia 2 de março,
deparamo-nos com o texto do segundo versículo do capítulo 3 do Evangelho de
Marcos, o qual nos propomos comentar sob a luz da Doutrina Espírita, assim
prosseguindo nosso estudo de passagens do Noto Testamento. A epígrafe que
inicia o capítulo, “Cura do homem com a mão atrofiada”, já dá uma ideia do assunto:
“E o observavam para ver se o curaria no sábado, para o
acusarem.”
Tem gente assim, desconfiada e maldosa, que só espera um deslize nosso
para alardear o quanto de mal há em nossas ações e intenções, não importando
quanto de bem façamos às suas vistas. Tudo quanto lhes interessa é apontar o
dedo da acusação e dizerem, como donos da verdade e da razão: “Eu não disse?” É
esse um comportamento característico dos seres ainda na infância espiritual e
Jesus tanto os lamentava quanto procurava auxiliá-los, admoestando-os, a fim
de, uma vez compreendendo, eles pudessem se modificar. No entanto, hoje sabemos
ser muito lenta nossa transformação moral e eis-nos aqui, dois mil anos depois,
tentando assimilar a essência dos ensinamentos do Cristo enquanto ainda
vinculados ao rigor da lei mosaica...
A psicologia transpessoal nos fala dos homens que, do ponto
de vista espiritual, ainda se encontram dormindo um sono sem sonhos; ao lado
desses há os que já conseguem sonhar; outros, ainda, estão semi despertos e
conseguem entrever a verdade, ao passo que existem aqueles completamente
despertos vivendo a verdade com alguma plenitude. Segundo Carl Gustav Jung, “quem
olha para fora sonha; quem olha para dentro desperta” – e foi com o intuito de
nos fazer despertar depressa de nosso sono milenar que o Cristo veio
pessoalmente ao mundo, aqui encontrando três tipos de seres, na concepção de
Huberto Rohden (*), que é a mesma argumentada por Paulo de Tarso:
materializados, psíquicos e espirituais.
Estamos transitando de uma condição inferior para outra
imediatamente superior, embora levados ao sabor do tempo, de modo que gastamos
séculos, talvez milênios para galgar os patamares evolutivos que nos aguardam o
esforço. Enquanto isso não se dá, contentamo-nos com os parâmetros herdados da
tradição – familiar, social, religiosa... – sem questioná-los, até sofrermos os
necessários abalos que vêm nos tirar da zona de conforto. O advento do Cristo,
trazendo-nos a suavidade de seu jugo – a Lei de Amor –, foi um desses abalos
morais que sacudiu para sempre a Humanidade materializada, convidando-a para as
revoluções que a alma deve proceder em si mesma para cumprir os desideratos da
Evolução.
Com as lições de Jesus, hoje revividas e complementadas pelo
Espiritismo, temos plenas condições, se assim o desejarmos, de romper de uma vez
por todas com o rigorismo antigo e limitador, para abraçarmos as propostas
libertárias do Cristianismo. Afinal, devemos nos perguntar, por qual razão os
Emissários celestiais têm vindo constantemente à Terra insistir no convite à
ação fraterna e coletiva entre os povos de todas as nações? É que este mundo e
seus habitantes, a Humanidade inteira, fazem parte do grande programa de
aperfeiçoamento da Obra Divina e já nos encontramos suficientemente maduros
para abraçar a tarefa redentora. Desse modo, vemos que todos os sábados são
dias em que devemos, imitando Jesus de Nazaré, arregaçar as mangas, tomar da
charrua e trabalhar o solo de nossas almas, curando assim nossas mãos por muito
tempo atrofiadas...
(*) Filósofo brasileiro, criador da Filosofia Univérsica e
autor de vários livros que exploram a dimensão cósmica e mística do
Cristianismo.
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