Esta data no Evangelho (19 de março)

Francisco Muniz




Sob a epígrafe “Zaqueu”, o capítulo 19 do Evangelho de Lucas registra o encontro entre este cobrador de impostos, publicano (*), portanto, e Jesus, na cidade de Jericó. É de lá que tiramos o assunto de nossos comentários neste dia 19 de março, compulsando o texto do terceiro versículo, que na Bíblia de Jerusalém apresenta-se como segue:

“Ele procurava ver quem era Jesus, mas não o conseguia por causa da multidão, pois era de baixa estatura.”

Vencer a multidão nem sempre é tarefa muito fácil, principalmente quando ela se expressa em variadas manifestações no âmbito interno de nossa condição humana. Se externamente, como se deu com Zaqueu, ela se oferece como obstáculo à nossa apreciação do que esteja além do olhar, em razão de nossa baixa estatura, internamente atrapalha nossa visão espiritual, pois é grande a multidão dos defeitos que precisamos transformar, e dos erros que devemos corrigir. Sendo assim, a fim de buscarmos a Jesus, é necessário reconhecermos nossa baixa estatura moral e encetarmos a marcha em sua direção, sacralizando cada uma de nossas atividades até o ponto de finalmente sermos notados pelo Cristo, que enfim recompensará nossos esforços “ceando” em nossa casa íntima.

Nos livros da Coleção Fonte Viva (**), Emmanuel, interpretando passagens do Novo Testamento, faz muito interessantes abordagens acerca do papel das multidões, principalmente na relação com o Nazareno. Num certo momento, o Mestre, procurando aliviar os corações aflitos, chama a todos os sofredores, pois nele encontramos, através das lições consoladoras, o imprescindível refrigério. No entanto, as multidões que acorrem ao chamado do Cristo são motivadas muitas vezes pelos interesses imediatistas, de cunho meramente materialista, devidos à nossa condição moral ainda inferior e à indiferença quanto às questões do Espírito imortal. Entretanto, continua ecoando nas consciências desatentas o sublime convite: “Vinde a mim todos vós!”

Ao dizer que Zaqueu “procurava ver quem era Jesus”, Lucas revela a condição de muitos enfermos da alma que, em busca da cura para seus muitos males, desconfia dos terapeutas e respectivos talentos, alguns sucumbindo assim à ação sufocante da multidão de inimigos internos. Leva-nos a recordar o episódio narrado em Marcos 2:5, quando um paralítico foi levado ao Cristo e este se encontrava em casa de Pedro, comprimido por uma multidão. Ante a impossibilidade de se chegar ao Mestre pela porta, amigos desse homem o introduziram à sala através de uma abertura no teto, causando a admiração do Rabi. São nossos amigos internos, portanto, que nos aproximam da dimensão crística, como a vontade dinamizada pela fé sólida e a esperança de que não há mal que sempre dure, ao contrário do bem, que é permanente, posto que divino.

Assim, ao procurarmos Jesus, que nos ensina a buscar constantemente (***) e a não nos satisfazermos com o que encontrarmos, indo cada vez mais para frente e para o alto, deve mover-nos o desejo sincero de modificar nossa condição presente, de modo a recuperarmos a pureza de nossa essência espiritual. É aí que a participação dos amigos – tanto os encarnados quanto os desencarnados, assim como os sentimentos que nos jazem latentes no íntimo – se faz efetiva, levando-nos a sucessivas vitórias sobre nós mesmos até encontrarmos a cura definitiva.

Notas

(*) Ver “Notícias históricas”, terceira parte da Introdução a O Evangelho Segundo o Espiritismo, por Allan Kardec.

(**) Trata-se dos livros Fonte Viva, Pão Nosso, Vinha de Luz e Caminho, Verdade e Vida, todos psicografados por Francisco Cândido Xavier e publicados pela Federação Espírita Brasileira.

(***) É o que diz um dos “logia” do Evangelho de Tomé (considerado apócrifo): “Aquele que busca continue procurando até quando encontrar; encontrando, ficará perturbado; perturbado, ficará maravilhado; e, maravilhado, reinará sobre o todo”.


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