Francisco Muniz -
O versículo 3 do capítulo 16 de Atos dos Apóstolos contém o assunto
que deveremos comentar neste dia 16 de março, no prosseguimento de nosso estudo
de algumas passagens do Novo Testamento. A epígrafe do texto transcrito abaixo,
sempre retirado da Bíblia de Jerusalém, é “Na Licaônia, Paulo escolhe
Timóteo” e nossa abordagem será feita com base na Doutrina Espírita:
“Querendo Paulo que ele partisse consigo, realizou a sua
circuncisão, por causa dos judeus que havia naqueles lugares. É que todos
sabiam que seu pai era grego.”
Um certo dito popular informa que “em Roma, faça como os romanos”,
significando a necessidade de se conhecer não só a cultura, representada pelos
usos e costumes de um povo, mas também sua legislação, a fim de se evitar
cometer erros que poderão ter consequências imprevisíveis e certamente
desagradáveis. Paulo, o ex-doutor da Lei Saulo de Tarso, conhecia o funcionamento
da mentalidade judia, apegada ao rigorismo das tradições mosaicas, e quis preservar
seu pupilo Timóteo quanto a futuros problemas nas comunidades judaicas que
visitariam. Ele, que já havia atravessado “a Síria e Cilícia, confirmando as
Igrejas, alcançou em seguida Derbe, depois Listra”. É nesta última que vivia
Timóteo com sua mãe, “uma mulher judia que abraçara a fé [cristã], e de pai
grego”.
Em nota de rodapé, a Bíblia de Jerusalém ressalta que “Paulo
se opunha a que cristãos vindos da gentilidade se fizessem circuncidar (*), mas
Timóteo era filho de uma judia e, portanto, segundo o direito judaico, era
israelita”. Ora, o que o Apóstolo dos Gentios pregava era que, uma vez
convertidos à doutrina revolucionária do Cristo, os crentes deviam romper em
definitivo com os antigos costumes ditados pela Lei. Os pressupostos da
legislação de Moisés perderam seu significado desde que Jesus, o Messias,
iniciara seu ensinamento, afirmando ter vindo não para destruir a lei, mas para
cumpri-la. Entretanto, ele veio cumprir a Lei de Deus, resumindo os 10
mandamentos em apenas dois (**), procurando demonstrar que a nova justiça, que
representava, era mesmo superior à antiga, por isso começava suas pregações com
esta frase: “Ouvistes o que foi dito aos antigos, eu, porém, vos digo...”
Ao conceituar o Espiritismo como uma doutrina eminentemente
filosófico-científica de consequências morais, Allan Kardec confirmava o
pensamento paulino, na tentativa de esclarecer os profitentes da fé espírita quanto
ao que de fato importa ao Espírito imortal em trânsito no planeta pela encarnação,
em razão tanto de sua destinação quanto de suas necessidades evolutivas. Assim,
somos – os espíritas – orientados no sentido de quebrarmos o vínculo com antigos
condicionamentos, principalmente no âmbito do pensamento, ou da mente, a fim de
nos possibilitarmos alcançar os objetivos propostos: a transformação íntima que
nos elevará à condição de homens (e mulheres!) de bem.
Assim como enxergamos nos ensinos de Jesus um caráter eminentemente
revolucionário, ao nos propor mudanças radicais, isto é, no sentido de
atacarmos os problemas que nos afligem exatamente em sua raiz, de igual forma
precisamos ver a preciosa ferramenta que para isso é a Doutrina Espírita. Desse
modo, importa preservarmos a pureza das orientações dos Espíritos anotadas pelo
Codificador, evitando, o quanto possível, “misturar o joio ao bom grão”, ou seja,
inserir na prática espírita certos artifícios próprios da cultura supostamente
religiosa, de crendices de caráter meramente supersticioso, desfigurando a
Doutrina e corrompendo seus ideais, que são os mesmos do Cristo, que continua
presidindo ao movimento transformador do mundo, apesar da resistência que
muitos querem lhe opor, inutilmente.
Notas
(*) Ver a Epístola aos Gálatas, capítulos 2 (versículo 3) e
5 (1 a 12).
(**) Amar a Deus sobre todas as coisas; e amar ao próximo como
a si mesmo.
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