Francisco Muniz //
Hoje inauguramos o mês de março e a busca aleatória na Bíblia
de Jerusalém levou-nos ao relato do médico Lucas, amigo de Paulo de Tarso e
um dos evangelistas. Falamos do livro Atos dos Apóstolos, em cujo versículo 3
do primeiro capítulo encontramos o assunto de nossos comentários de hoje, dia
1, nestes termos:
“Ainda a eles, apresentou-se vivo depois de sua paixão,
com muitas provas incontestáveis: durante quarenta dias apareceu-lhes e falou
do que concerne ao Reino de Deus.”
Incontestavelmente, Lucas se refere às aparições de Jesus a
seus discípulos após a ressurreição, estando com eles 40 dias, período durante
o qual deu-lhes as últimas orientações acerca das verdades do Reino dos Céus,
além de apresentar a todos, especialmente a Tomé, a realidade viva, ponderável,
palpável mesmo, de sua condição de Espírito imortal. Segundo o evangelista,
eram “provas incontestáveis” – e não podia ser diferente, em se tratando do
Cristo, aquele que disse ser o caminho da verdade e da vida e que veio “para
que todos tenham vida”, como afirmara à mulher samaritana (João 4:5-15). Desse
modo, suas lições atravessaram os séculos e hoje dizem respeito a cada um de
nós, principalmente nós que escolhemos cristianizar-nos pelo Espiritismo.
Vale ressaltar a simbologia do número 40, o qual, segundo
Pastorino (*), é utilizado no Evangelho de João, eminentemente místico, para
significar um ciclo completo de aprendizado espiritual, equivalente aos ciclos
reencarnatórios que capacitam o Espírito à cura de suas mazelas íntimas. Vemos,
com alguma frequência, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento, referências a
esse número: Moisés levou 40 anos no deserto conduzindo os hebreus do Egito à
Terra Prometida; Jesus esteve 40 dias no deserto meditando em jejum, quando
sofreu as tentações. Há dois mil anos, a expectativa de vida era muito mais
reduzida do que na atualidade, de forma que um homem de 40 anos já era
considerado velho, advindo desse fato, talvez, a mística em torno desse número.
Para nós, contudo, fica o ensinamento substancial acerca da
vida real do Espírito, levando-nos a considerar a importância da Doutrina
Espírita para a evolução da Humanidade, apesar do reconhecimento de que todos
somos imortais e ao fim de nossa jornada terrena nos transferiremos
inapelavelmente, pelo fenômeno da morte física, para o plano espiritual. Para fazer
o coroamento de seu ensino sobre a imortalidade, Jesus apresentou-se “vivo” a
seus seguidores, isto é: ele condensou seu perispírito a tal ponto que lhe deu
toda a aparência de um organismo vivo, segundo as leis da matéria. Por isso
pôde Tomé, movido por uma alegada incredulidade (**), tocar-lhe as chagas que o
Cristo materializou nas mãos e pés de seu corpo espiritual.
O Espírito, portanto, não é uma entidade sobrenatural,
fantasmagórica ou demoníaca, mas um ser eminentemente natural, uma vez criado
por Deus, cuja principal atribuição é auxiliar o Criador no aperfeiçoamento de
sua Obra, começando por si mesmo. Para tanto, ele tem de cumprir necessariamente
diversas etapas de aprendizado, até alcançar aquele estado de perfeição moral
referido por Jesus, perfeição essa que tem como parâmetro a própria Divindade.
Assim, será aos poucos que conheceremos a verdade que liberta, vencendo
sucessivos períodos de "40 anos" até nos vermos crescidos “em graça e sabedoria”,
como Lucas definiu a infância e a juventude de Jesus...
Notas
(*) Carlos Torres Pastorino, autor de Sabedoria do
Evangelho (ed. Sabedoria, Rio de Janeiro).
(**) Tal informação careceria de sentido, se considerarmos
as palavras desse apóstolo nos registros textos gnósticos encontrados na
biblioteca de Nag-Hammadi (Egito), em 1945, conhecidos hoje como o Evangelho de
Tomé.
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