Francisco Muniz //
“A primeira Páscoa” intitula a segunda parte do Evangelho de
João, tratando da ida de Jesus a Jerusalém para participar, com seus
discípulos, da maior festividade dos judeus de seu tempo. Nele, o segundo versículo,
colocado sob a epígrafe “Estada em Jerusalém”, é a fonte de nossos comentários neste
dia 24 de fevereiro, de modo que apresentamos o texto, colhido na Bíblia de
Jerusalém:
“Mas Jesus não tinha confiança neles, porque os conhecia
a todos (...)”
Antes de dizermos por que Jesus, sendo o médium de Deus, nos
conhece a todos, vejamos o que as reticências escondem, relendo o versículo
anterior e principalmente o posterior, a fim de melhor compreendermos o
pensamento do evangelista. João informa que “enquanto estava [o Mestre,
evidentemente] em Jerusalém, para a festa da Páscoa, vendo os sinais que ele
fazia, muitos creram em seu nome” (2:23); Jesus, como vemos, não dá crédito a
essa multidão, “(...) e não necessitava que lhe dessem testemunho sobre o homem,
porque ele conhecia o que havia no homem”.
Realmente, com sua presciência o Messias não somente lia na
alma, na mente daquelas pessoas, do mesmo modo como avalia o alcance de nossa
capacidade de discípulos, seus novos seguidores pelo Espiritismo. Ele sabia de
tudo que teria a enfrentar em sua jornada missionária pelo mundo, porquanto
devidamente informado da disposição volúvel da população, que num primeiro
momento o aplaudia e logo depois pediria por sua crucificação. Sim, o Nazareno,
o Filho de Deus conhecia, como conhece, os meandros do coração humano, razão
pela qual pôde dizer a Joana de Cusa, por exemplo, que o amasse à distância,
servindo melhor a seu marido, à própria família.
Do mesmo modo, fez Pedro saber que o Pescador ainda não possuía
os requisitos morais suficientes para segui-lo a toda parte, como Simão havia impulsiva
e ingenuamente declarado, uma vez que nos momentos cruciais de sua prova o
apóstolo o negaria três vezes. Jesus identificava a fraqueza de caráter nas
pessoas da mesma maneira como observa nosso poder de recuperação a cada
defecção, recebendo-nos de volta ao seu rebanho após cada fuga de nossas
responsabilidades. Não é à toa que seu amoroso convite ainda reverbera em nossa
consciência, chamando-nos a atenção para trilharmos o único caminho capaz de
nos tirar do pântano de nossa inferioridade moral: “Vinde a mim todos vós que
estais aflitos e sobrecarregados e eu os aliviarei!”
Mas é preciso, sobretudo, como João indica em seu Evangelho,
sabermos conquistar a confiança do Cristo, ou, dizendo melhor, tornarmo-nos
confiáveis, o que só é possível vivendo as lições imortais que Jesus nos legou.
O Mestre não confia em quem somente o procura em função dos fenômenos que podem
observar até o êxtase espiritual, uma vez que tais demonstrações não produzem a
necessária transformação moral para a construção e posterior adesão ao Reino de
Deus. É imperioso que saibamos vestir a túnica nupcial, símbolo da aquisição de
valores imperecíveis requisitados à participação no luminoso banquete espiritual
referido na Parábola do Festim de Núpcias (Mateus 22:1-14).
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