Francisco Muniz //
A epígrafe que abre o capítulo 7 do Evangelho de Marcos é
bastante sugestiva: “Discussão sobre as tradições farisaicas”, e é de lá que
vem o assunto que abordaremos neste dia 7 de janeiro, comentando o primeiro
versículo, lido, como habitualmente, na Bíblia de Jerusalém:
“Ora, os fariseus e os escribas vindos de Jerusalém se
reúnem em volta dele.”
Jesus estava na Galileia, em ação benemérita nas regiões do
entorno do lago de Genesaré, fazendo a vontade de Deus, cumprindo a Lei, ou
seja: ao mesmo tempo que beneficiava os sofredores e os muito necessitados de
seu amor, o Mestre ensinava suas lições que propõem, ainda hoje, a libertação
do Espírito de sua prisão na inferioridade, e isso muito desagradava os religiosos
profissionais de seu tempo, representados principalmente pelos escribas e pelos
fariseus, opositores da tarefa missionária do Nazareno. Assim, movidos pelo
espírito da discórdia, constantemente eles se reuniam em torno do Cristo...
A observação de Marcos, portanto, deve ser profundamente
meditada por cada um de nós que, tencionando estar mais perto do Messias,
aproximamo-nos dele através das atuais expressões do Cristianismo, mormente o
Espiritismo. É, mesmo, de se perguntar, como fazia uma antiga companheira de
lides espiritistas: o que estamos fazendo do Espiritismo (do Cristianismo, em
suas múltiplas manifestações)? A bem da verdade, a pergunta deve ser feita nos
moldes apontados pelo evangelista: com que interesse nos aproximamos do Cristo?
O que de fato queremos dele?
A resposta pode ser desconcertante, uma vez que a postura
farisaica ainda não desapareceu de todo de nosso comportamento, de modo que
demoramos para assimilar as propostas revolucionárias que Jesus nos legou há
mais de dois mil anos e o fato é que nos vemos muito mais atentos a nossos
interesses particularistas do que entregues ao trabalho de renovação moral a
que somos convocados desde então. É que ser cristão – cristão verdadeiro! – dá muito
trabalho, assim como não é fácil ser espírita – espírita igualmente verdadeiro!
E, de acordo com as palavras do Apóstolo Paulo, em mensagem aproveitada por
Allan Kardec em O Evangelho Segundo o Espiritismo, “o verdadeiro
espírita e o verdadeiro cristão são uma só e a mesma coisa, porque todos
aqueles que praticam a caridade são os discípulos de Jesus, qualquer que seja o
culto a que pertençam” (1).
É claro que o Espírito Paulo, que animou o corpo do Apóstolo
dos Gentios, se refere, aí, à verdadeira caridade, aquela que exige o esquecimento
de si mesmo para atender às necessidades do próximo, quaisquer que elas sejam,
significando a vitória do ser imortal, pela abnegação, sobre o ego interesseiro. As
propostas de Jesus, portanto, são tanto disciplinadoras do caráter quanto
buriladoras do Espírito em sua tarefa de desenvolvimento no rumo do Reino dos
Céus. Fiquemos, assim, com as palavras lúcidas do escritor espírita baiano
Evilásio Meneses (2), encerrando estes comentários:
"O
Cristo não deve ser, apenas, representado em atos de liturgia religiosa, mas
reverenciado intimamente em cada momento de nossa vida, na sociedade e na
família, no sentir diferente do comum das criaturas dispersas, sem, porém,
lamentá-las como infelizes, porque chegará o dia em que cada um realizará essa
essencial transformação, ou seja: descobrir os aspectos pessoais e impessoais
de Deus dentro de si. Deus como inteligência espontânea em seu eu superior (não
sou eu que faço, mas o Cristo que age em mim), Deus nas leis imutáveis que
determinam o crescimento e a ascensão perante a Consciência Cósmica."
Notas
(1) Cap. XV, item 10 das Instruções dos Espíritos (“Fora da caridade
não há salvação”).
(2) Evilásio
Menezes, in Pedagogia da Consciência, ed. EME.
Comentários
Postar um comentário
Abra sua alma!