Francisco Muniz //
A “Explicação da parábola do semeador” é a epígrafe do
versículo 12 do oitavo capítulo do Evangelho de Lucas, o qual comentaremos hoje,
dia 8 de dezembro, com o auxílio do cabedal interpretativo da Doutrina
Espírita. O texto, lido na Bíblia de Jerusalém, traz estas palavras:
“Os que estão ao longo do caminho são os que ouvem, mas
depois vem o diabo e arrebata-lhes a Palavra do coração, para que não creiam e
não sejam salvos.”
Com efeito, a grande maioria de nós está mesmo ao “longo do
caminho” (Marcos e Mateus preferem dizer “à beira do caminho”, mas convenhamos
que em Lucas a expressão ganha mais sentido, apontando aqueles que se põem em
marcha, pois somente os caminhantes estão sujeitos às tentações). Embora
afeiçoemo-nos à mensagem e à proposta do Cristo, ainda estamos muito ocupados
com nossas questões pessoais de ordem material – e a matéria e seu culto são o
diabo referido por Jesus, de acordo com a interpretação abalizada de Carlos
Torres Pastorino.
Segundo o autor de Sabedoria do Evangelho, a matéria
é o “antissistema” a oferecer oposição ao Espírito, em cuja esfera está o
verdadeiro Sistema, porquanto é a própria dimensão divina em ação em toda
parte. Se considerarmos o que os Espíritos Superiores disseram a Allan Kardec
(1), afirmando que a matéria limita a percepção do Espírito encarnado, pela
influência que exerce sobre este, conviremos com o Cristo que ela é o “diabo” e
seu culto, o materialismo, é o mal a que o Espiritismo veio oferecer combate.
Vê-se aí, portanto, a necessidade de despertarmos com a urgência possível para as
questões essenciais do Espírito imortal, que é anterior e sobrevivente à vida física.
Os Espíritos nos dizem que devemos cuidar muito mais da alma
que do corpo, nesta proporção: do corpo, como se fôssemos viver cem anos; e da
alma, como se fôssemos desencarnar amanhã. A função do corpo (da matéria) é dar
sustentação ao Espírito para que este desenvolva suas tarefas no mundo; no
entanto, graças aos desvios de percepção do ego, a matéria, através do corpo,
tem oferecido muito mais tentação que apoio, pelas paixões que suscita na alma
invigilante. Foi o que Jesus observou quando orava no Horto das Oliveiras, ao
pedir que Pedro, Tiago e João se mantivessem despertos, na noite de sua prisão:
“Vigiai e orai, para que não entreis em tentação; na verdade, o
espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mateus 26:41).
Nos apontamentos de Platão, lemos (2) esta observação de
Sócrates que, como o Cristo, nada deixou escrito: “Chamo homem vicioso a esse
amante vulgar que ama o corpo antes que a alma (...)”. Precursores das ideias
espíritas que Kardec desenvolveria séculos mais tarde, os filósofos gregos
também prepararam o caminho para a mensagem de Jesus acerca do exercício do amor
como antídoto ao veneno do materialismo: “O amor está por toda parte na Natureza,
que nos convida a exercitar nossa inteligência; é encontrada até nos movimentos dos astros. É o amor que orna a Natureza de seus ricos tapetes; ele se enfeita e
fixa sua morada lá onde encontra flores e perfumes. É ainda o amor que dá a paz
aos homens, a calma ao mar, o silêncio aos ventos e o sono à dor.” (3)
A matéria (o corpo), portanto, não ama, mas pode ser objeto
do amor que é e está no Espírito e este, exagerando nesse amor desviado de suas
finalidades, cede à tentação e, deixando de ouvir as propostas libertárias do
amor que é e vem do Cristo, aprisiona-se mais e mais.
Notas
(1) Ver O Livro dos Espíritos, questão 148 (comentário
do Codificador).
(2) O Evangelho Segundo o Espiritismo, Introdução:
Resumo da doutrina de Sócrates e de Platão.
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