Francisco Muniz //
“Abandonar-se à Providência” é a epígrafe do versículo 28 do
parágrafo 12 do Evangelho de Lucas, cujo texto, retirado da Bíblia de
Jerusalém, comentaremos hoje, dia 28 de dezembro, continuando nosso estudo
de passagens do Novo Testamento. Ei-lo:
“Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que existe
hoje e amanhã será lançada ao forno, quanto mais a vós, homens fracos na fé!”
As palavras de Jesus são mais um apelo a fortalecermos nossa
fé em Deus, nos poderes da Providência, acreditando que somos e estamos sempre
muito bem assistidos e nada faltará para desenvolvermos nossas provas e delas
sairmos vitoriosos. Ter fé, mesmo do tamanho de um grão de mostarda, conforme o
Mestre assegurou, é abandonar-se à Providência, ou seja, acreditar
incondicionalmente que a bondade do Altíssimo é incessante e por isso sempre seremos
cumulados de misericórdia por mais tormentosa seja a situação enfrentada.
Abandonar-se à Providência, pois, é manifestar fé, que é a extrema confiança na
proteção que o Pai de amor e bondade exerce junto a cada um de seus filhos,
mesmo suportando-lhes a ingratidão.
No entanto, como o Cristo reconhece, ainda somos “fracos na
fé”, porque a manifestamos cegamente, sem saber como conduzi-la, submetendo-a
quase que unicamente ao império das paixões, até despertamos, um dia, para os
impositivos da razão. Nesse dia, nós a manifestaremos racionalmente, sabedores
do que ela representa e como deve ser direcionada a fim de colimar os objetivos
a que se propõe, indo além do simples conforto pela certeza da proteção divina.
Segundo Allan Kardec, “não há fé inabalável senão aquela que pode encarar a
razão face a face, em todas as épocas da Humanidade” (*). Por prender-se ainda
à cegueira espiritual é que a fé da maioria dos homens os retém chumbados no
chão da inferioridade moral, impedidos de alçar voos mais altos.
O Espiritismo, em revivendo a pureza da doutrina de Jesus, é
a renovação do convite que o Divino Pastor nos faz no sentido de fortalecermos nossa
fé em sua amorosa assistência e assim caminharmos intimoratos pelas estradas do
mundo, desenvolvendo as asas do amor e da sabedoria, com as quais voaremos em
direção ao objetivo traçado. Recordando que, como disse Agostinho de Hipona, a fé
é a mãe da esperança e da caridade (2), é por esta, o amor em movimento, que
transformaremos nosso egoísmo e, estimulados pela esperança de um futuro
melhor, daremos os passos necessários para instruir nossa ignorância, adquirindo
os conhecimentos que nos alçarão aos píncaros da dimensão espiritual, em nossa
união com a Divindade.
De acordo com um Espírito Protetor (3), “a caridade é
impossível sem a fé” e, separadas, não bastam “para manter, entre os homens,
uma ordem social capaz de torná-los felizes”. Ainda segundo ele, “podereis
encontrar, em verdade, impulsos generosos mesmo nas pessoas sem religião, mas
essa caridade austera que não se pratica senão pela abnegação, pelo sacrifício
de todo interesse egoístico, não há senão a fé para inspirá-la, porque nada
além dela nos faz levar com coragem e perseverança a cruz desta vida”. Desse
modo é que, ao peso das dificuldades, em vez de curvar a fronte para baixo,
lamentando os infortúnios, devemos, motivados pela fé, voltar os olhos para o
alto e buscar a Deus e seu amparo providencial que não nos deixarão desfalecer.
Notas
(1) O Evangelho Segundo o Espiritismo.
(2) São elas as três virtudes teologais que Santo Agostinho
instituiu como dogma da Igreja.
(3) O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XI, item 13 (A
fé e a caridade).
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