Esta data no Evangelho (27 de dezembro)

Francisco Muniz // 




Eis que estamos de volta ao Evangelho de João, desta feita para abordarmos o versículo 27 do capítulo 12, números correspondentes a esta data de 27 de dezembro. A epígrafe é “Jesus anuncia a sua glorificação através da morte” e o texto, que comentaremos de acordo com as luzes da Doutrina Espírita, é o que segue, lido na Bíblia de Jerusalém:

“Minha alma está agora conturbada. Que direi? Pai, salva-me desta hora? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim.”

João passou à história religiosa do mundo como “o discípulo que Jesus amava” (e incluímos aí um “mais” que contradiz as palavras do Mestre na resposta ao pedido de Salomé, mãe dos dois mais novos membros do Colégio Apostolar, uma vez entendendo que não se trata de preferência pessoal, mas identificação de competências) e seguramente era, dentre os Doze, o de maior percepção espiritual, daí seu Evangelho ser apontado como o mais místico dentre os canônicos, isto é, aqueles aceitos pela Igreja. Os escritos de João, portanto, fogem à classificação atribuída aos evangelhos sinópticos, assim chamados por guardarem semelhança entre si, como é o caso dos livros de Marcos, Mateus e Lucas.

Fazemos essa introdução para dizer que em João a postura do Messias nos instantes em que se aproximava seu sacrifício é de peremptória afirmação, nunca de dúvida ou hesitação, o que fica patente nas duas perguntas feitas após salientar a conturbação em sua alma. Porque, como ele indica ao final, foi exatamente para esse momento glorioso que veio ao mundo, com a finalidade de nos ensinar a viver para efetivamente aprendermos a morrer, isto é, não temermos o instante em que, deixando a efemeridade da vida material, vamos reentrar no mundo da verdade. Afinal, foi para isto que descemos à face escura do planeta: para deixarmos brilhar nossa luz espiritual!

Os discípulos sinceros do Cristo não podemos, pois, pedir a Deus que nos salve da hora do sacrifício, quando isto é o melhor para nós, uma vez que não fomos criados para o mundo, sendo este apenas uma das muitas moradas que o Pai nos destinou. É mais útil, portanto, refletirmos acera da vida futura, o que vamos ou podemos encontrar após nossa partida do mundo das formas. Segundo o Espírito Pascal, “ao viajor que chega a uma estalagem, se dá um belo alojamento se pode pagá-lo; àquele que pode pouca coisa, se dá um menos agradável; quanto àquele que nada tem, vai deitar sobre a palha. Assim ocorre com o homem na sua chegada ao mundo dos Espíritos: seu lugar está subordinado ao que tem (...)” (*)

É mais inteligente de nossa parte ocuparmo-nos com realizações edificantes durante a encarnação, para que o dia da despedida não nos encontre ociosos e sem as condições favoráveis a uma boa recepção no plano espiritual, onde não nos será perguntado quem éramos nem o que tínhamos sobre a Terra, mas o que dela levamos conosco: “Não se computará o valor dos seus bens, nem dos seus títulos, mas a soma das suas virtudes” – é ainda Pascal quem informa, acrescentando que “a esse respeito, o operário pode ser mais rico do que o príncipe (...) Os lugares aqui não se compram, eles se ganham pelo bem que se fez (...) Aqui, tudo se paga com as qualidades do coração”.

O sacrifício a que o homem é chamado a fazer durante sua vida terrena deve ser entendido, pois, como o desprendimento em relação a tudo que ele não aproveitará na vida espiritual. Nosso aprendizado pelo Espiritismo consiste, portanto, no discernimento entre o que é real e perene e o que não tem senão a aparência de verdade. Com isso não haverá a possibilidade de vexames “do outro lado”.

(*) O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. XVI, Instruções dos Espíritos, item 9 (A verdadeira propriedade).


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