Esta data no Evangelho (9 de novembro)

Francisco Muniz


O capítulo 11 da primeira Epístola de Paulo aos Coríntios é dedicado às recomendações relativas à “Boa ordem nas assembleias” e o versículo 9, correspondente a este dia 9 de novembro, é contemplado com a epígrafe “O véu das mulheres”. Eis o texto que lemos na Bíblia de Jerusalém, que comentaremos de acordo com a interpretação da Doutrina Espírita:

“E o homem não foi criado para a mulher, mas a mulher para o homem.”

(Inicio estas linhas ouvindo a música de Tom Zé na qual este compositor baiano pede perdão ao Papa Francisco...) Desde que a Igreja Católica se apossou da herança cristã, a partir da oficialização do Cristianismo como religião do Império Romano do Ocidente, devemos duvidar da autenticidade dos escritos tornados canônicos, isto é, aqueles autorizados pelo Vaticano desde então. Porque os escritos originais foram copiados e traduzidos várias vezes e, como se sabe, se um erro é cometido na reescritura, ele pode ser repetido, perdendo-se o sentido de algumas palavras ou de frases inteiras. Por isso dizem os italianos que o tradutor é um traidor da língua.  

É bem possível, portanto, que algo assim tenha acontecido com o teor das cartas de Paulo, especialmente no tocante ao tema que ora abordamos, relativo à participação das mulheres nas atividades religiosas. A condução da Igreja é ainda eminentemente masculina, do mesmo modo como no Templo de Jerusalém, no Judaísmo, as mulheres, inferiorizadas, eram proibidas de realizar os ofícios. Somente com Jesus é que a feminilidade conhece alguma valorização e talvez por isso a Igreja consentiu em lhe dar, no máximo, um papel de coadjuvante, nunca de protagonista, porquanto Maria de Magdala, a quem o Mestre exaltara perante os apóstolos, sofria execração do grupo, especialmente por parte do ciumento Pedro, patrono da Igreja Católica Apostólica Romana. A esse respeito, recomendo a leitura do livro O Evangelho Gnóstico de Tomé, de Hermínio Miranda (1), onde se lê esta afirmativa de Jesus sobre essa Maria: “Se eu quiser, farei dela um homem, um espírito vivo”.

No entanto, aprendemos com o Espiritismo que homens e mulheres são iguais perante Deus e têm os mesmos direitos, uma vez que ambos detêm “o conhecimento do bem e do mal e a faculdade de progredir”, conforme destaca O Livro dos Espíritos (2). Do ponto de vista moral, portanto, a mulher só é inferior, em certos países, por causa “do domínio injusto e cruel que o homem assumiu sobre ela”, como “resultado das instituições sociais e do abuso da força sobre a fraqueza. Entre homens moralmente pouco adiantados, a força faz o direito”. Em Boa Nova (3), o Espírito Humberto de Campos também faz eco às informações de Allan Kardec, concordando com o Cristo quanto à importância da mulher: “Tendo avançado mais do que o seu companheiro na estrada do sentimento, está, por isso, mais perto de Deus que, muitas vezes, lhe toma o coração por instrumento de suas mensagens, cheias de sabedoria e de misericórdia”.

Eis, pois, a razão pela qual as mulheres são maioria nas assembleias espíritas, mormente no tocante ao exercício da mediunidade, atendendo à responsabilidade que o amor do Cristo lhes conferiu. Referindo-se ao convite do Nazareno às crianças (4), o Espírito João, o Evangelista, comenta (5): “Jesus queria que os homens viessem a ele com a confiança desses pequenos seres de passos vacilantes, cujo chamamento lhe conquistaria o coração das mulheres, que são todas mães; submetia, assim, as almas à sua terna e misteriosa autoridade”. Para elas, portanto, o Espiritismo foi revelado à Humanidade – e o foi também por elas, as médiuns do século XIX, desde as irmãs Fox, nos EUA, e as jovens irmãs Boudin e Japhet, além de Ermance Dufaux e da inesquecível Mme. de Plainemaison, em cuja residência o Prof. Hippolyte Léon Denizard Rivail obteve o anúncio de sua missão redentora.

Notas

(1) Ed. Lachâtre, SP, 1995.

(2) Questões 817 e seguintes, referentes à Lei de Igualdade.

(3) Cap. “A mulher e a ressurreição”. Ed. FEB, RJ, 1941.

(4) “Deixai vir a mim as criancinhas, não as impeçais.” (Marcos 10:13-16)

(5) O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. VIII, item 18.


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