Francisco Muniz
“A escolha dos lugares” é a epígrafe do versículo 11 do
capítulo 14 do Evangelho de Lucas, no qual Jesus nos fala da humildade.
Trata-se de uma parábola contada, em tom de reprimenda, quando o Mestre, junto
com seus discípulos, foi cear na casa de “um dos chefes dos fariseus” e viu os
outros convidados – legistas e fariseus – escolhendo os melhores lugares à mesa.
Eis, assim, o texto extraído da Bíblia de Jerusalém para nossos
comentários, dedicados à minha filha Shirley, que aniversaria neste dia 14 de
novembro:
“Pois todo aquele que se exalta será humilhado, e quem se
humilha será exaltado.”
O ensinamento é lapidar: ao escolhermos, na casa dos outros,
o que julgamos ser melhor para nós, poderemos ter a decepção de ver o dono do
lugar nos separar do objeto de nosso desejo em benefício de um outro convidado.
Para evitarmos situações desagradáveis desse porte, pondera o Cristo, o ideal é
nos colocarmos na retaguarda, numa posição subalterna, conscientes de nossa condição
de servidores. Aquele que serve deve, portanto, estar sempre pronto para receber
as ordens de seus superiores, que saberão destacá-lo do conjunto quando isso
for propício.
Conhecedores de nossas muitas mazelas morais, os Espíritos
Superiores que auxiliaram Allan Kardec na codificação do Espiritismo dizem (1) que
os homens em estágio na Terra temos dois defeitos característicos: o egoísmo e
o orgulho. É este último o principal obstáculo à vivência da humildade, impedindo
que façamos com a desenvoltura necessária o aprendizado do amor incondicional
proclamado por Jesus: “Aprendei de mim que sou manso e humilde de coração” (Mateus
11:29).
Filha do orgulho, a vaidade é outra paixão impeditiva do
exercício da humildade, levando os homens a dar exagerada importância ao que é perecível,
isto é, ao que não tem valor algum na esfera espiritual, especialmente quando
nos despedimos das experiências na carne. No plano espiritual, tudo o que
importa são os valores que exornam o caráter e a alma, desprezando-se os
títulos e a fortuna conquistados na Terra. Aqui, exibimo-nos uns aos outros,
competindo por regalias e privilégios que em nada nos elevarão como Espíritos.
Segundo o Espírito Emmanuel (2), a mais importante das
atividades que realizamos na Terra é a religiosa – e seria pobreza intelectual reduzir
essa afirmativa à expressão rasteira do religiosismo praticado no mundo, resumido
na frequência eventual a um templo ou ao serviço realizado pelos religiosos
formados para isto. A postura religiosa preconizada pelo antigo mentor de Chico
Xavier consiste, segundo podemos compreender, nas demonstrações de fé e
reverente obediência dos desígnios divinos, santificando-se assim todas as
nossas ações no campo da vida social ou nas particularidades de nossa vida
íntima.
É desse modo que a humildade nos favorece, engrandecendo-nos
perante Deus, mais do que quando a ele nos dirigimos em prece, fazendo nossos
petitórios ou agradecendo “pelas graças alcançadas”. Mas é, contudo, “uma
virtude bem esquecida” entre nós, conforme salienta o Espírito Lacordaire em O
Evangelho Segundo o Espiritismo (3), afirmando que os grandes exemplos que
nos foram dados são bem pouco seguidos. No entanto, diz Lacordaire, sem a
humildade não podemos ser caridosos para com o nosso próximo. Desse modo, se
fora da caridade não há salvação, como reza o lema da Doutrina Espírita, o
orgulho é a causa de nossa perdição.
Notas
(1) O Livro dos Espíritos, questão 785, ed. FEB.
(2) Caminho, Verdade e Vida, psicografia de Francisco
C. Xavier, ed. FEB.
(3) Cap. VII, item 11 (Instruções dos Espíritos: O orgulho e
a humildade).
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