Esta data no Evangelho (30 de outubro)

Francisco Muniz



Vem do versículo 30 do capítulo 10 da primeira Epístola de Paulo aos Coríntios o assunto de nosso estudo de passagens do Novo Testamento neste dia 30 de outubro, novamente sob a epígrafe “As carnes sacrificadas aos ídolos. Soluções práticas”, conforme a organização da Bíblia de Jerusalém. Eis o texto, que comentaremos a partir das orientações da Doutrina Espírita:

“Se tomo alimento dando graças, por que seria eu censurado por causa de alguma coisa pela qual dou graças?”

Em linguagem popularesca, poderíamos refazer a pergunta de Paulo de Tarso nestes termos: “O que você tem a ver com o modo como eu me comporto?” Ou seja, o Apóstolo dos Gentios questiona aí a ingerência alheia sobre seus atos, tanto que no versículo anterior ele reclama: “Por que a minha liberdade haveria de ser julgada por outra consciência?” Certa vez, um amigo me confidenciou que não dorme com sua reputação, mas com sua consciência, o que nos levou a considerar que nossa reputação é o que os outros pensam e falam de nós – e isso, realmente, não nos deve importar.

O fato é que os outros ficariam muito contentes se fizéssemos tudo o de que gostariam, mas isso seria nos violentarmos, negando nosso poder de escolha, o livre arbítrio que Deus nos concede para bem atuarmos no mundo, buscando crescer para Ele. No entanto, o Cristo Jesus nos pede para fazermos aos outros o que gostaríamos que eles nos fizessem, e não o contrário. E mais: o Mestre considerou ser o maior no Reino dos Céus aquele que no mundo se fizer o servidor (algumas traduções grafam “escravo”) de todos, mas entendemos que aí se trata de ação voluntária do candidato à santidade.

Em O Livro dos Médiuns, Allan Kardec, que foi um dia saudado como “o bom senso encarnado”, pondera que os bons Espíritos não constrangem aqueles dos quais se aproximam. O constrangimento, portanto, é ação das mentes inferiores que alimentam interesses particularistas e inconfessáveis. Reza o ditado popular que, quem não ajuda, atrapalha. Vivemos todos em regime de interdependência e nossa relação com o outro deve ser sempre de respeito aos direitos de cada um, reciprocamente. Se não há reciprocidade nesse respeito, haverá sempre a intromissão e a imposição contrárias ao bem viver.

Assim como não podemos exigir nada de ninguém, não devemos aceitar que decidam por nós o que é somente de nossa responsabilidade, sob pena de nos vermos cerceados em nossa liberdade de ação. A intenção, ao nos aproximarmos de alguém, deve ser sempre a de auxiliar para a superação de alguma dificuldade, não para complicar o problema. Para tanto, importa sabermos quais são os limites de nossos direitos e deveres, o que Kardec expõe judiciosamente nas páginas de O Evangelho Segundo o Espiritismo (1), ao falar especificamente dos dois tipos de espíritas: “Um é como o músico que se comove com certos acordes, ao passo que o outro não ouve senão sons (...) enquanto que um se compraz em seu horizonte limitado, o outro, que compreende alguma coisa de melhor, esforça-se para dele se libertar e sempre o consegue quando tem vontade firme”.

Sobre direitos e deveres, o Espírito Emmanuel pontuou certa vez que “o espírita só tem um direito, o de cumprir seus deveres”. Nossa consciência, que pretendemos iluminada pela razão e pela fé, não deve violentar outras consciências nem sofrer constrangimentos alheios, mas tal experiência nos indicará sempre quem é que anda ao nosso lado, revelando a verdade de certo dito popular reformulado pelo mesmo Emmanuel nestes termos: “Dize-me o que pensas e te direi com quem andas” (2).

Notas

(1) Cap. XVII, item 4, “Os bons espíritas”.

(2) Livro Roteiro, psicografia de Chico Xavier.


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