Francisco Muniz
“A oração de Jesus” é a epígrafe que inicia o capítulo 17 do Evangelho de João, cujo versículo 10 nos dá ensejo para os comentários deste dia 17 de outubro. Segundo a Bíblia de Jerusalém, essa oração “é a grande prece de oblação e de intercessão do Salvador, na hora de seu sacrifício”. Vamos, então, observar o texto sob nossa análise:
“(...) e tudo o que é meu é teu e tudo o que é teu é meu,
e neles sou glorificado.”
Já tivemos ocasião, aqui, de comentar acerca de nossa
condição de herdeiros da Divindade, o que Jesus explicita na Parábola do Filho
Pródigo. Nessa prece feita pelo Messias em seus instantes derradeiros no mundo
como Espírito encarnado, provavelmente no Horto das Oliveiras, em Jerusalém,
ele pede a Deus por nós, seus irmãos mais novos, pelas ovelhas que, sendo o
Pastor deste aprisco, o Pai lhe confiou, conforme o versículo anterior: “Por
eles eu rogo; não rogo pelo mundo, mas pelos que me deste, porque são teus
(...)”. E a razão dessa intercessão é explicada no versículo 11, no qual o Mestre
destaca sua reentrada no plano espiritual, ciente da morte próxima de seu corpo
material: “Já não estou no mundo; mas eles permanecem no mundo e eu volto a ti.
Pai santo, guarda-os em teu nome que me deste para que sejam um como nós”.
Mas procuremos interpretar o versículo que nos coube tanto
pela essência da doutrina de Jesus quanto pelas novas orientações do Cristo,
vindas através da revelação espírita e veremos aí mais uma lição referente ao
desapego quanto às coisas do mundo. Efetivamente, tudo quanto temos é de Deus,
dele as coisas que julgamos conquistar chegam-nos por empréstimo divino e nesse
aspecto somos tanto coparticipantes da abundância de luz que é o banquete
espiritual, como também somos responsáveis pelo zelo de tudo que é de Deus. Um
exemplo disso é a família que formamos, especialmente quando temos filhos: a
esposa, ou o marido, e a prole não são propriedades nossas, mas individualidades,
assim como nós mesmos, que estão juntas na mesma experiência de crescimento. É
uma tarefa de aformoseamento dos seres da qual teremos de prestar contas mais
tarde.
No prefácio do livro Constelação Familiar (1), a
Benfeitora Joanna de Ângelis conta uma história, em tom de alegoria, na qual
ressalta que a tarefa dos pais junto aos filhos deve ser realizada sem qualquer
tom de apego. O Cristo, para quem trabalhamos aqui na Terra, recomenda a
renúncia de si mesmo àqueles desejosos de seguir seus passos a fim de servi-lo
melhor, o que quer dizer atentarmos para a essência do compromisso, que não contempla
nenhuma coloração personalista. Do mesmo modo que devemos honrar pai e mãe,
como reza o mandamento de Deus, temos a obrigação de cuidar dos filhos com a
consciência de que devemos devolvê-los ao Criador em situação bem melhor do que
aquela de quando os recebemos. É o que também enfatiza o escritor Hermínio
Miranda em seu livro Nossos Filhos São Espíritos (2).
A esse respeito, vale muito ponderarmos a lição que o autor
libanês Khalil Gibran Khalil oferece-nos num belíssimo poema (3): “Vossos
filhos não são vossos filhos. São os filhos e as filhas da ânsia da vida
por si mesma. Vêm através de vós, mas não de vós. E embora vivam
convosco, não vos pertencem. Podeis outorgar-lhes vosso amor, mas não
vossos pensamentos, porque eles têm seus próprios pensamentos. Podeis
abrigar seus corpos, mas não suas almas; pois suas almas moram na mansão
do amanhã, que vós não podeis visitar nem mesmo em sonho. Podeis
esforçar-vos por ser como eles, mas não procureis fazê-los como vós, porque
a vida não anda para trás e não se demora com os dias passados. Vós sois
os arcos dos quais vossos filhos são arremessados como flechas vivas. O
arqueiro mira o alvo na senda do infinito e vos estica com toda a sua força
para que suas flechas se projetem, rápidas e para longe. Que vosso encurvamento na mão do arqueiro seja vossa alegria,
pois assim como ele ama a flecha que voa, ama também o arco que
permanece estável”.
Notas
(1) Psicografia de Divaldo Franco, ed. LEAL.
(2) Ed. Lachâtre.
(3) “Sobre os filhos”, in: O Profeta, várias
editoras.
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