Francisco Muniz (*)
Introdução
Nos relatos do Novo Testamento, especificamente aqueles
relacionados aos ensinos do Cristo nas páginas sublimes do Evangelho, há
referência a cinco duplas de irmãos cujo comportamento merece um acurado exame
sob as luzes da Doutrina Espírita. Essas duplas são as seguintes: os irmãos
João e Tiago; os da Parábola do Filho Pródigo; os que provocaram Jesus quanto à
partilha de uma herança; aqueles da Parábola dos Dois Filhos; e, por fim, as
irmãs Marta e Maria.
Jovens ainda, João e Tiago já haviam sido alistados pelo
Cristo no grupamento apostolar quando a mãe deles, Salomé, esposa do pescador
Zebedeu, procurou o Mestre para fazer uma exigência (Mateus, 20:20) que
revoltou os outros companheiros, especialmente Pedro, por demais ciumento. Ela
queria, nos cuidados exagerados que as mães têm para com os filhos, que Jesus
distinguisse os rapazes no Reino dos Céus, colocando um à direita e outro à
esquerda do Filho do Homem.
Na Parábola do Filho Pródigo (Lucas,
15:11-32) contada por Jesus para nos fazer entender a dimensão do amor
divino, um reino sobretudo misericordioso onde a inclusão é a realidade, um dos
dois irmãos, presumivelmente o mais velho, fica em casa enquanto o outro vai
esbanjar no mundo a parte que lhe coube da herança paterna. Quando da volta
deste, para a alegria de seu pai, o primogênito se enche de ciúmes.
Certa vez, um rapaz elevou sua voz do meio da multidão,
durante uma pregação do Mestre, pedindo que o Messias intercedesse por ele junto
a seu irmão quanto à partilha de uma herança (Lucas, 12:13), recebida pela
morte do pai de ambos. Acontece que, por tradição, a maior parte do espólio cabia
ao primogênito e Jesus, o mestre do Espírito, por sua vez, questionou o
querelante: “Quem me fez juiz de vossas causas?”
Já na Parábola dos Dois Filhos (Mateus, 21:28 a 32), Jesus
de Nazaré apresenta-nos um proprietário de terras que tinha dois filhos e pedira
a ambos que fossem trabalhar no cultivo de uma vinha. O primeiro disse que não
queria, mas se arrependeu e foi. Quanto ao outro, afirmou que iria, mas jamais
apareceu para o trabalho. Perguntando a quem o ouvia sobre qual dos filhos
havia feito a vontade de seu pai, o Cristo ouviu declararem que tinha sido o
arrependido...
Por fim, as irmãs Marta e Maria receberam um dia a visita do
Messias e seus discípulos (Lucas, 10:38-42). Maria, a mais nova, prontamente se
sentou aos pés de Jesus para ouvi-lo, enquanto sua irmã foi cuidar dos
preparativos para a refeição e arrumar a casa. Cansando-se, Marta vai a Jesus e
diz-lhe que peça a Maria para ajudá-la nos trabalhos. O Senhor, porém, retruca:
“Marta, você se ocupa com muitas coisas quando só uma é necessária!” E acrescenta:
“Maria escolheu a melhor parte e esta não lhe será tirada.”
Agora, vamos ver que lições podemos tirar de cada uma dessas
passagens, usando as chaves interpretativas que o Espiritismo nos assegura,
pelas informações fornecidas pelos Espíritos como também pelas conclusões às
quais chegou Allan Kardec. Para tanto, alicerçaremos, o quanto possível, nossas
observações nas obras da Codificação e nas que lhes são sucedâneas, fazendo
alguma ponte com os ditos “pecados capitais” da Teologia cristã.
1.
Ambição
Como sabemos, Jesus explicou à mãe dos jovens João e Tiago
que não cabia a Ele mesmo determinar quem se sentaria à sua esquerda ou à sua
direita, mas ao próprio Deus, que é quem dá sempre a primeira e a última
palavra em termos de julgamento. Por isso é que o Mestre informou a Salomé que
ela não sabia o que estava pedindo, uma vez que não basta solicitarmos
deferências da esfera espiritual se não temos qualquer merecimento. Algo assim
pode ser observado na Terra, onde as relações de poder extrapolam as noções de
mérito e desse modo vemos pais intercederem pelos filhos, almejando boas
colocações para eles no mercado de trabalho, por exemplo, em detrimento, muitas
vezes, de pessoas mais qualificadas. Nesse sentido, para contornar semelhantes abusos,
os concursos públicos foram instituídos.
No Céu – isto é, no mundo espiritual -, porém, o que conta,
mesmo, é a elevação pessoal, garantida pelo mérito de cada um conquistado através
do trabalho desinteressado no campo da caridade. Nesse aspecto, vale recordar o
que se passou com o Espírito André Luiz quando quis reivindicar, em “Nosso Lar”
(vide o livro homônimo psicografado por Chico Xavier), o privilégio de
desempenhar naquela Colônia as funções do médico que havia sido na última
vilegiatura carnal. Naturalmente, sua pretensão ele próprio reconheceu
descabida, observando a conversa do Governador da Colônia com uma outra
solicitante, e lá se foi André adquirir algum merecimento varrendo as
enfermarias de Nosso Lar...
Esse entendimento quem nos facilitou foi o próprio Jesus,
quando referiu aos apóstolos a importância relativa de seu primo João, o
Batista. Segundo o Senhor, dos homens “nascidos de mulher”, ou seja, aqueles
ainda marcados pela materialidade, João era o maior. Isto quer dizer que, dentre
os Espíritos encarnados naquele período, na Terra, e ainda vinculados à
frequência vibratória do planeta, inexistia outro mais evoluído que o profeta
que veio aplainar as veredas para a tarefa missionária do Cristo. Como se
percebe, obviamente Jesus excluía a si próprio, porquanto não era um simples
homem, mas o Filho do Homem, ou seja, aquilo que os homens serão um dia, uma
vez aperfeiçoados.
Também aí se observa a figura nefasta do nepotismo, atitude
tão afeita à classe política que dirige os destinos do povo brasileiro, sejam
eles governantes, legisladores ou autoridades jurídicas. Mal sabem eles que no
Além, para onde irão um dia, o que vige é a hierarquia moral que distingue o
mérito individual. Mas como os Espíritos nos dizem que nossos dois grandes
males a se combater são o egoísmo e o orgulho (vide O Livro dos Espíritos),
defeitos que ainda comandam as ações dos poderosos da Terra, durante mais algum
tempo ainda veremos o contestado exemplo da mulher de Zebedeu manifestado nas
experiências humanas.
2.
Ciúme
Não é raro encontrarmos inimizades entre irmãos
consanguíneos, ainda que o ambiente familiar seja o ideal para a formação e o
estreitamento dos laços afetivos, a fim de que espíritos endividados possam se
reajustar perante as Leis Supremas, passando a viver em clima de verdadeira
fraternidade. Esse é um dos objetivos da reencarnação, através da qual a
Justiça divina oferece os meios mais adequados a tal reajuste, conforme o
aprendizado da Doutrina Espírita nos esclarece e deixa patente.
Mas antes de tratarmos dos irmãos citados na Parábola do
Filho Pródigo, recordemos que no Velho Testamento (Gênesis, 4) há outra dupla
de irmãos consanguíneos que protagonizou um episódio provocado pelo ciúme: Caim
e Abel, filhos do primeiro casal, segundo o relato bíblico. Saliente-se que,
embora o ciúme seja um dos muitos defeitos que a persona esconde em sua sombra,
ele não é listado entre os “pecados capitais” classificados pela Teologia
cristã (católico-protestante), que se ocupa apenas da ira (ou raiva), gula,
luxúria, inveja, soberba, preguiça e avareza. Num certo sentido, a inveja
manifesta-se como ciúme e foi esse o móvel do crime de Caim ao assassinar seu
irmão, julgando que Abel era o preferido de seus pais.
Realmente, as almas ainda na infância espiritual não lidam
bem com a rejeição, porque nesses casos o ego fala mais alto, malgrado todas as
lições e exemplos voltados para as atitudes superiores e benevolentes. Está aí
o lado sombra aflorado na figura do irmão mais velho do “filho pródigo”. Até a
chegada desse irmão “perdulário” à casa paterna, estava tudo muito bem na zona
de conforto do primogênito, em sua vidinha normal – e medíocre, pois ele nada
ousava! – ao lado de seu pai e de todos os servos deste, comportando-se como se
um deles fosse.
Reclamando do pai que lhe dava tudo e nada exigia, não concorda
com o prêmio oferecido ao irmão recém-chegado, que aos seus olhos merecia
castigo: “Para mim, nem um cabrito para um churrasco com meus amigos, mas para
esse aí é um banquete!” Egoísta, não pensou na alegria que seu pai sentia com a
volta daquele que “estava perdido e foi encontrado”. Mas está justamente nesse
diálogo a lição que o Cristo nos quis transmitir, observando que nossa relação
com o Pai Supremo ainda é deficitária e se faz na base da barganha, muitas
vezes em detrimento dos companheiros de jornada.
Com efeito, não poucas vezes observamos, se não somos nós o
protagonista ou a vítima, situações em que, para conquistar um título, uma
posição destacada na sociedade ou uma simples vaga num estacionamento, alguém “puxa
o tapete” de um competidor usando os mais ardilosos artifícios. Esse competidor
é um irmão, mas é visto como um rival, um adversário que deve ser sobrepujado a
todo custo, “porque ele não pode ter nem ser mais do que eu”. E se ele ousa ter
e ser mais do que o invejoso, aí é que os golpes da sordidez se intensificam,
uma vez que o invejoso perde o sono imaginando formas de vencer aquele que elegeu
como inimigo.
3. Cobiça
Ainda me lembro da canção “A namoradinha de um amigo meu”, em
cuja letra Roberto Carlos avisa, desde os anos 1960: “O que é dos outros não se
deve ter.” O alerta quanto à cobiça, no entanto, é bem mais antigo. Está nas
tábuas da Lei recebidas por Moisés no alto do Monte Sinai, já lá se vão mais de
40 séculos. Textualmente, os dois últimos mandamentos da lei prescrevem o
seguinte (Êxodo, 20:17): “Não desejareis a mulher do vosso próximo” e “Não
desejareis a casa do vosso próximo, nem seu servidor, nem sua serva, nem seu
boi, nem seu asno, nem nenhuma de todas as coisas que lhe pertencem.”
Como se percebe, cobiçar e desejar são uma só coisa e sobre
o desejo o príncipe Sidarta Gautama, o Buda, disse ser a origem do sofrimento
na Terra, porque o homem deseja ardentemente a felicidade (que ele desconhece,
convenhamos, iludido qual se encontra em seu lugar no mundo) e sofre terrivelmente
por não lograr alcançá-la. Mas que é a felicidade para o homem, se
frequentemente ele a procura onde ela não está? Porque a verdade é que no livro
de Eclesiastes, na Bíblia, é dito que a felicidade não é deste mundo, assim
como Jesus afirmou sobre seu reino (João, 18:36).
Jesus, é bom recordar, não desceu à face escura do planeta
para satisfazer às exigências gananciosas do ego enganador, mas para lançar luz
sobre as questões sombrias da humanidade. Por essa razão o Mestre, nessa
passagem do Evangelho de Lucas (12:13-21), questiona aquele que levantou a voz
para reclamar de seu irmão: “Quem me fez juiz de vossas causas?” Ou seja: que
os homens ainda aferrados às ilusões da matéria resolvam entre si suas
pendências de ordem materialista, pois não devem “os mortos enterrar seus
mortos”? E o Cristo, portanto, advertiu: “Tenham cuidado com qualquer tipo de
ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, sua vida não depende de
seus bens.”
Conforme se depreende, o que importa é cuidarmos das
questões afetas à economia do espírito, fazendo escolhas inteligentes que
promovam nossa libertação do jugo da matéria, especialmente em face de nossa ignorância
quanto ao momento de retornarmos ao mundo espiritual propriamente dito. Por tal
razão, o Cristo nos avisa, em O Evangelho Gnóstico de Tomé (1): “Para o
lugar aonde ireis, não devereis levar coisa alguma, porque o que levardes
poderá impedir vossa passagem pela porta estreita.” Esse aviso é semelhante
àquele que recomenda acumular tesouros no Céu, que são os valores da alma, que
o ladrão não rouba nem a ferrugem e a traça corroem (2).
4.
Preguiça
Aqui (vide a Parábola dos Dois Filhos - Mateus, 21:28 a
32) se trata de atender à vontade da autoridade representada pela figura paterna
expressa numa convocação. Na nossa esfera, aqui no mundo, essa autoridade é
tanto o pai biológico – ou quem lhe faça as vezes – quanto o patrão (a parábola
estabelece a relação entre patrão e empregados, ainda que sejam pai e filhos)
ou o professor, na relação com os alunos, ou ainda quem guarde alguma
ascendência hierárquica sobre alguém. Mas está claro que, em primeira e última
instância, o senhor da vinha referido por Jesus nesta e em outras parábolas é
Deus, o Pai de misericórdia que solicita amorosamente o concurso de seus
filhos, que somos todos nós. No entanto, estamos sempre ou dizendo não ou
postergando nossa adesão ao trabalho na imensa Seara colocada à nossa
disposição.
A esse respeito, lembremos que um dia Jesus, caminhando com
seus apóstolos, possivelmente observando alguma plantação, declarou ser grande
a seara mas os trabalhadores são poucos – e orientou: “Peçam a Deus que mande
trabalhadores para a seara!” (Mateus, 9:37-38) Aí se enfatiza a necessidade do
trabalho, que é uma lei universal (O Livro dos Espíritos, questão 674 e
seguintes) e por ele os Espíritos encarnados cumprem sua expiação com vistas à
quitação dos próprios débitos contraídos perante as sábias Leis Divinas. Trata-se,
pois, do trabalho de auto aperfeiçoamento, do embelezamento da alma “com a doce
claridade das virtudes”, como fala o Espírito Jerônimo de Albuquerque, mentor
do Centro Espírita Deus, Luz e Verdade, em Salvador.
É um trabalho que vimos postergando há séculos! Ainda que
tal esforço resulte satisfatório e altamente compensador, poucos fazem de fato
“a vontade do Pai” cultivando – e colhendo – a parte que lhes cabe nessa vinha
que é a própria alma. Recordemos a dificuldade que encontrou um rei – um rei! –
para reunir em seu salão de banquete os convidados para o casamento de seu filho,
conforme o relato do Cristo referente à Parábola do Festim de Bodas (3). Estavam
todos muito ocupados com seus interesses materiais imediatistas e não quiseram
saber de atender ao convite repetidamente efetuado – e tudo porque não haviam
realizado a imprescindível preparação para esse banquete: não tinham a veste
nupcial.
Era esse o caso do filho que disse “já vou”, segundo podemos
depreender, pois, assim como a participação no banquete de casamento exigia,
para a atuação na vinha do Senhor, nosso Pai amantíssimo, faz-se necessária uma
preparação, pois não basta apenas ter a vontade de lá estar. Supondo que o
outro filho, o que disse “não quero”, já conhecesse a peculiaridade desse
trabalho, por tal motivo ele decidira voltar atrás em sua decisão,
arrependendo-se de ter se negado a atender ao convite de seu pai – afinal,
“manda quem pode e obedece quem tem juízo”, segundo reza o dito popular.
O arrependimento é o meio, concluímos, de nos tornarmos merecedores
de novas oportunidades por parte da Divindade, da autoridade participante da
situação em que nos encontramos momentaneamente. Portanto, quanto menos
tergiversarmos ou postergarmos a ação benemerente, melhor para nós, porque mais
depressa conquistaremos os prêmios (ainda que Deus não premie, porque também
não castiga, estamos sujeitos a algumas deferências, uma vez que, pedindo,
obteremos, conforme disse o Mestre) a que façamos jus.
5. Soberba
Marta tomou para si a realização de tarefas ordinárias, em
vez de aproveitar a inigualável oportunidade que o Cristo conferia tanto a ela
mesma quanto a sua irmã, pois, como Jesus afirmara algures, “nem sempre me
tereis”. Acumulando os afazeres sobre os próprios ombros, logo viu-se
assoberbada e, em vez de pedir a ajuda de sua irmã, apelou para a autoridade
mais próxima, acreditando que lhe seria feita justiça, mesmo à custa do bem-estar
de terceiros. Para sua surpresa e decepção, a autoridade representada por Jesus
decide em favor de Maria. Essa decisão, tomada do ponto de vista da realidade
espiritual, contraria frontalmente o “status quo” do mundo, pondo em xeque o
comportamento baseado no orgulho.
De que adianta, portanto, ter muitos títulos, gozar de uma
reputação meramente mundana e dizer estentoricamente “sabe com quem está
falando?”, se perante o Poder Supremo toda empáfia se desfaz como a espuma no
mar? Pois não queria Marta sobrepujar a condição de sua irmã, colocando-se ela
mesma como merecedora da complacência de Jesus, a mais do que a humilde Maria, que
ajoelhou-se aos pés do Mestre? No entanto, a resposta do Nazareno fê-la retomar
a sensatez, ou, por outra, fez com que Marta caísse de seu pedestal e
reconhecesse que sim, ela não podia abarcar o mundo dizendo a si mesma que era
capaz de tudo fazer. O perfeccionismo, pois, é uma faceta desse orgulho que a
todo tempo tentamos mascarar.
“Marta, tu te ocupas com muitas coisas, quando só uma é
necessária!” – disse-lhe o Cristo e, assim como essa irmã de Lázaro, também
recorremos ao Senhor pleiteando honrarias e privilégios dos quais nossos irmãos
– sejam eles consanguíneos ou não – são muito mais merecedores. Por isso “a
melhor parte”, a dos seres que se mostram obedientes, receptivos, resignados –
humildes, em suma, não foi nem será tirada jamais de quem se comporta como aquela
Maria que se prostrou aos pés de Jesus, a mesma mulher piedosa que entraria mais
tarde na casa de um fariseu para lavar os pés do Messias com suas lágrimas e
enxugá-los com os próprios cabelos (4).
Essa parte necessária é, portanto, o imprescindível em nossa
vida: o aproximarmo-nos do Cristo e seus emissários e com eles aprendermos as
lições que nos libertam do jugo material, das muitas ocupações que elegemos como
importantes mas só o que fazem é inflar nosso ego e terminam por nos cansar. E
o novíssimo modo de nos aproximarmos do Divino Amigo é através da reconciliação
com nossos irmãos, agindo sempre solidária e fraternalmente, perdoando-os
quando necessário e pedindo-lhes o perdão quando errarmos, humilhando-nos a fim
de crescermos aos olhos de Deus. Só assim aplacaremos nosso grande orgulho,
porquanto “os males mais numerosos são os que o homem cria pelos seus vícios,
os que provêm do seu orgulho, do seu egoísmo, da sua ambição, da sua cupidez,
de seus excessos em tudo” (5).
1. Conclusão
Pela filiação divina, todos os homens são irmãos, mas, contraditoriamente,
estamos ainda divididos por falsas crenças e circunstâncias separatistas, como
as ideias de raça, sangue, família, tribo, nação, país... Desse modo, não
estranha que a competição seja a marca dos relacionamentos no mundo, levando os
homens à exploração de uns sobre os outros, significando o esquecimento do Pai
criador e suas recomendações quanto às manifestações de fraternidade. Eis por
que o traço comum entre as civilizações que se sucedem no mundo seja a guerra e
o belicismo, em consequência, seja uma de nossas principais características –
vencê-la é então nosso esforço.
E, para fazer com que tal estado de coisas chegue a um
termo, a Divindade nos tem oferecido os mais diversos mecanismos e
oportunidades, facilitando o reajustamento entre os irmãos, os filhos rebeldes
daquele Pai que nos ama imensamente e espera a Eternidade inteira que voltemos ao
Seu colo magnânimo. Um desses mecanismos é a reencarnação, através da qual espíritos
que se inimizaram têm a oportunidade de retornar às experiências na Terra no
mesmo ambiente familiar, às vezes, desde o ventre materno, como irmãos gêmeos. Dessa
forma entendemos por que Jesus afirmou ser preciso no reconciliarmos depressa
com nossos adversários enquanto estamos a caminho com eles.
A propósito, ao se referir à família universal, aquela na qual
os participantes comungam dos mesmos ideais, guardando, portanto, as mesmas
afinidades, Jesus declarou que seus irmãos são os que fazem a vontade do Pai. Assim,
além de obedecerem às determinações de seus pais biológicos, os irmãos têm por dever
cumprirem os mandamentos da Lei
de Deus, como forma de conjurarmos os frutos de “eras sombrias”, no dizer de Eusébio
(6). São tempos, segundo ele, “caracterizados pela opressão e maldade
recíprocas, em que temos vivido, odiando-nos uns aos outros”. Desse modo, “vemos
a Terra convertida em campo de quase intérminas hostilidades”, salienta o
orientador do Espírito André Luiz.
É então que
o mecanismo do perdão precisa ser buscado e conscientemente utilizado para
proveito de ambas as partes envolvidas na querela, a partir da compreensão da
resposta de Jesus à pergunta do apóstolo Pedro: “Quantas vezes perdoarei a meu
irmão?” – “Perdoar-lhe-eis não sete vezes, mas setenta vezes sete vezes.” Sobretudo,
a recomendação do Espírito Simeão (7) sobre o perdão das ofensas merece ao menos
uma reflexão: “Eis uma dessas palavras de Jesus que mais devem atingir a vossa inteligência
e falar mais alto ao vosso coração.”
“Comparai
essas palavras de misericórdia com as da oração tão simples, tão resumida e tão
grande em suas aspirações, que Jesus dá aos seus discípulos, e encontrareis
sempre o mesmo pensamento.” Certo, Simeão se refere à oração do Pai Nosso, na
qual, recitando-a, pedimos a complacência divina, condicionando-a, porém, ao
nosso perdão “a quem nos tenha ofendido”. Mas o Instrutor espiritual pondera
que perdoar as ofensas é uma atitude inteligente. Com efeito, “perdoar os
inimigos é pedir perdão para si mesmo: perdoar aos amigos, é dar-lhes uma prova
de amizade; perdoar as ofensas é mostrar que se tornou melhor”, completa o
apóstolo Paulo, com esta ressalva: “Ai daquele que diz: “Eu nunca perdoarei”,
porque pronuncia a sua própria condenação” (8).
Notas
(*) Jornalista, aprendiz do
Espiritismo; escritor, autor dos livros Lições do Evangelho para a Vida Prática; O
Chamado; Casas do Evangelho; e Por Causa Dele – pequenas histórias do tempo de
Jesus.
1 – Hermínio Correa de Miranda, O
Evangelho Gnóstico de Tomé, Ed. Lachâtre.
2 – Evangelho
de Mateus, capítulo 22, versículos 1 a 11.
3 – Evangelho
de Mateus, capítulo 6, versículos
19 e 20.
4 – Evangelho
de João, capítulo 12, versículos 1 a 8.
5 – Allan
Kardec, A Gênese, capítulo III, item 7.
6 – Francisco
C. Xavier, No Mundo Maior, pelo Espírito André Luiz, ed. FEB.
7 – Allan Kardec,
O Evangelho Segundo o Espiritismo, ed. IDE.
8 – Idem, ibidem.
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