Os atributos de Deus

Francisco Muniz
(publicado originalmente na revista Visão Espírita n.° 20 - Ano II - Março de 2000)

"Quando dizemos que Deus é eterno, infinito, imutável, imaterial, único, todo-poderoso, soberanamente justo e bom, não temos uma ideia completa de seus atributos?" - pergunta Allan Kardec aos Espíritos Superiores, na questão 13 de O Livro dos Espíritos. Em resposta, os autores da Doutrina dos Espíritos dizem o seguinte:
Do vosso ponto de vista, sim, porque acreditais abranger tudo; mas ficai sabendo que há coisas acima da inteligência do homem mais inteligente, e para as quais vossa linguagem, limitada às vossas ideias e às vossas sensações, não dispõe de expressões. A razão vos diz, com efeito, que Deus deve ter essas perfeições em grau supremo, pois se tivesse uma delas de menos, ou que não fosse em grau infinito, não seria superior a tudo, e por conseguinte não seria Deus. Para estar acima de todas as coisas, Deus não deve estar sujeito a vicissitudes e não pode ter nenhuma das imperfeições que a imaginação é capaz de conceber. Deus é eterno. Se ele tivesse tido um começo, teria saído do nada, ou, então, teria sido criado por um ser anterior. É assim que, pouco a pouco, remontamos ao infinito e à eternidade. É imutável. Se ele estivesse sujeito a mudanças, as leis que regem o universo não teriam nenhuma estabilidade. É imaterial. Quer dizer, sua natureza difere de tudo o que chamamos matéria, pois de outra forma ele não seria imutável, estando sujeito às transformações da matéria. É único. Se houvesse muitos Deuses, não haveria unidade de vistas nem de poder, na organização do universo. É todo-poderoso. Porque ele é único. Se não tivesse o poder soberano, haveria alguma coisa mais poderosa ou tão poderosa quanto ele, que assim não teria feito todas as coisas e aquelas que ele não tivesse feito seriam obra de um outro Deus. É soberanamente justo e bom. A sabedoria providencial das leis divinas se revela nas menores como nas maiores coisas, e esta sabedoria não nos permite duvidar nem de sua justiça, nem de sua bondade.
Ora, recordemos, a respeito desta matéria, as palavras de Jesus conforme narradas por Lucas (18:18-19): "E perguntou-lhe um certo príncipe, dizendo: Bom Mestre, que hei de fazer para herdar a vida eterna? Jesus lhe disse: Por que me chamas bom? Ninguém há bom, senão um, que é Deus." Com efeito, entendendo a bondade como a soma de todas as virtudes, de todos os atributos da suprema perfeição, os quais só se encontram na Divindade, compreenderemos porque nem mesmo Jesus ousou comparar-se ou igualar-se a Deus. Embora o Mestre tivesse afirmado "eu e o Pai somos", o significado dessa frase talvez seja mais de identificação com os divinos desígnios e menos de assunção, por parte do Cristo, das qualidades que atribuímos a Deus.
Entendemos, assim, o quanto está ultrapassado, porque inexato, o conceito teológico que impõe ser o homem criado à imagem e semelhança de Deus, posto que tal ideia revela apenas a natureza humana, enquanto, por outro lado, humaniza Deus, o que é inconcebível. Certo é que, sendo Deus tal como são os homens, o Criador perderia muitos de seus atributos, dentre os quais a perfeição absoluta, o que é inadmissível. Do mesmo modo que o mestre não pode se confundir com seus alunos, assim também o Criador não pode ser confundido com suas criaturas. Deus, portanto, será sempre algo inconcebível em sua plenitude, porquanto ainda nos encontraremos limitados em nosso conhecimento das coisas intangíveis.
Entretanto, a noção de similitude ganha melhor sentido ao nos compararmos a Deus a partir de nossa essência espiritual, porquanto som os todos partes da Divindade e trazemos em nós seu germe. "Não está escrito: 'vós sois deuses'?", perguntou Jesus a seus discípulos, revelando que podemos fazer tudo o que o Mestre fez quando caminhou entre os homens, "e muito mais". Assim, devemos compreender Deus como o grande objetivo a ser alcançado além de uma infinita escadaria que subimos incessantemente, reunindo em nós, nessa jornada, os atributos que nos identificam com o Criador, segundo o pensamento de Léon Denis.
Deus, para esse grande pensador espírita francês, é a suprema Justiça: "Se há neste mundo uma necessidade imperiosa para todos os que sofrem, para quantos têm a alma dilacerada, não é essa a de crer, de saber que a justiça não é uma palavra vazia; que há, de qualquer maneira, compensações para todas as dores, sanção para todos os deveres, consolação para todos os males? Ora, essa justiça absoluta, soberana, quaisquer que sejam nossas opiniões políticas e nossas vistas sociais, devemos reconhecer perfeitamente, não é de nosso mundo. As instituições humanas não a comportam". Destarte, é imperioso reconhecer, Deus é essa justiça, essa bondade, essa perfeição, esse tudo.

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