Sentimento intuitivo da existência de Deus

Francisco Muniz
(publicado originalmente na revista Visão Espírita n.° 16 - Ano II - Setembro.1999)

Que se pode deduzir do sentimento intuitivo que todos os homens têm da existência de Deus?, pergunta Allan Kardec aos Espíritos Superiores na questão n.° 5 de O Livro dos Espíritos. Em resposta, os luminares desencarnados informam ao Codificador que tal sentimento revela tão somente "que Deus existe; de onde, pois, viria tal sentimento se repousasse no nada? É ainda uma consequência do princípio de que não há efeito sem causa". Em seguida, na questão 6, Kardec interroga se esse sentimento não seria fruto da educação e produto das ideias adquiridas, ao que os Espíritos reveladores da Doutrina esclarecem, por sua vez também questionando: "Se assim fosse, por que teriam os selvagens tal sentimento?" Kardec, então reflete e em braves palavras faz o seguinte comentário: "Se o sentimento da existência de um ser supremo fosse apenas produto do ensino, não seria universal e, como as noções de ciências, só existiria naqueles que o tivessem podido receber".
No entanto, é de sempre que tal sentimento permeia o conhecimento humano, por mais rude que seja. Já nos tempos pré-históricos, o homem primitivo temia as forças da natureza - o fogo, principalmente -, por serem algo que não se podia ainda controlar, tomando-as à conta de divindades, às quais passaram a render culto. Assim é que anteriormente à ideia de Deus, isto é, do Deus único, prevaleceu o panteísmo, até que os homens amadurecessem suficientemente o sentimento e a inteligência para conceituar a unidade divina. Essa compreensão surge da constatação de que tudo está em Deus e Deus está em tudo, ou nas palavras de Léon Denis, em O Grande Enigma, "porque trudo que está em Deus está nos seres, quando menos em estado de gérmen".
Quando o homem enfim compreender que "Deus é o Espírito Universal que se exprime e se manifesta na Natureza, da qual o homem é a expressão mais alta" (Denis, op. cit.), o sentimento instintivo logo cede lugar à fé e, usando a inteligência, racionaliza quanto á necessidade de cultivar em si mesmo esse germe, a fim de se engrandecer para Deus. "Todos os homens devem chegar a essa compreensão dessa natureza superior", exorta-nos Léon Denis, avisando que "na ignorância dessa natureza e dos recursos que em nós dormitam, é que está a causa de todas as provações, de nossos desfalecimentos e de nossas quedas".
Mas, a despeito do sentimento instintivo da existência de Deus que se observa em todos os povos de nosso orbe, há indivíduos que, quanto mais se esclarecem nas ciências do mundo, comprazem-se num estado de ceticismo, de negação da Divindade e de seus atributos. Para tais pessoas, a ciência tem todas as respostas para os fenômenos da Universo (e da vida!) e que a compreensão total é só uma questão de tempo e de estudo. Assim sendo, para os céticos, quanto mais nos esclarecermos, menos teremos necessidade de Deus. Ledo engano. Ao contrário, isso só aconteceria se progredíssemos apenas intelectualmente e ainda assim não teríamos as respostas para as questões mais profundas, as que dizem respeito à nossa natureza mais íntima...
Deixemos, porém, que Léon Denis, mais uma vez, toque nossa alma: "Consciente de sua ignorância e de sua fraqueza, o homem fica confundido diante dessa unidade formidável que abrange todas as coisas e com ela conduz a vida das Humanidades. Ao mesmo tempo, entretanto, o estudo do Universo lhe abre fontes profundas de gozos e de emoções. Apesar de nossa enfermidade intelectual, o pouco que entrevemos das leis universais nos arrebata; na Potência ordenadora das leis e dos mundos, pressentimos Deus, e, por isso, adquirimos a certeza de que o Bom, o Belo, a Harmonia perfeita, reinam acima de tudo".
Quão bom é, assim, sabermo-nos partícipes dessa obra!

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