Inimigos internos e o autoperdão

Francisco Muniz

"(...) E o homem terá por inimigos os de sua própria casa." Estas palavras de Jesus, contidas no Evangelho de Mateus, costumamos interpretar direcionando-as a nossos familiares, condicionados pela postura espírita a partir das informações reencarnacionistas, fazendo-nos entender que já convivemos anteriormente com aqueles que nos são caros, mas essa convivência nem sempre foi harmoniosa, o que explicaria as dificuldades de relacionamento observadas na atualidade, merecendo, da parte dos envolvidos, o necessário esforço que propiciará o pretendido reajustamento, mercê das sábias leis divinas.
É certo, contudo, que essa interpretação não está desprovida da veracidade que se procura no entendimento das questões aflitivas que o homem enfrenta, em busca de resoluções que levem à harmonização com o outro e consigo mesmo. No entanto, haverá mais sucesso se nessas avaliações o investigador focalizar a si mesmo em vem de especular a condição de outrem. Ainda que as experiências em conjunto venham a se concretizar em ganhos ou prejuízos individuais, é justamente em razão dessa consequência que os problemas devem ser vistos pelo prisma pessoal.
Entendemos que Jesus falava, quando aqui esteve, há mais de dois mil anos, para cada espírito imortal e não para as personalidades formadas pelos valores do mundo - e desse modo deveremos compreender que nossas questões são a priori individuais e como tal deverão ser consideradas, mesmo que tenham vinculação com A ou B. Assim, somos chamados a concluir que ninguém tem nada a ver com as razões de nossa problemática pessoal, do mesmo modo como não somos responsáveis diretamente pelo drama de ninguém. Compete, pois, a cada um, de per si, envidar os esforços imprescindíveis ao reequilíbrio, se não se quer perpetuar-se na atitude passiva perante a vida, ficando-se apático enquanto tudo em volta se renova e progride, a despeito dos ais de quem quer que seja.
Eis, então, que se faz urgente e inadiável o entendimento e a consequente assunção das responsabilidades pelos próprios atos, deixando de culpar os outros pelo que se nos acontece, mas, ao contrário, perdoando a todos que de alguma forma julgamos terem contribuído para nossa transitória infelicidade, pela simples compreensão de que fomos nós mesmos que quisemos assim, por nos permitirmos falir, iludir, menosprezar a oportunidade do refazimento e da corrigenda, dando vez aos verdadeiros inimigos nossos - os defeitos resultantes de nossa postura egoística e orgulhosa perante a vida.
Esse perdão, que em suma vem a ser doação de amor, deve ser facultado principalmente a nós mesmos. É, o autoperdão, medida profilática e terapêutica que devemos adotar para cura de nossa enfermidade mais profunda e também para evitarmos intercorrências nesse processo, tornando a cura efetiva. O autoperdão, assim, configura o ensinamento do Cristo que preconiza amar ao próximo como a si mesmo, o que quer dizer libertarmo-nos individual e coletivamente das injunções perniciosas das armadilhas criadas pelo ego. É preciso, nesse sentido, transcender a própria condição transitória, renunciando, como propõe Jesus, à personalidade enganadora, para que venha à tona a verdadeira condição de cada um, a permanente, a do espírito imortal, destinado à perfeição enquanto efetua sua romagem terrena...

Comentários

  1. Chico, que reflexão profunda. É isso mesmo. Assim como podemos nos amar intensamente, podemos nos sabotar, sendo nosso próprio inimigo. Adorei o blog, amigo. Parabéns!

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  2. O autoperdão é um bálsamo que eu ainda não consegui me aplicar, infelizmente. Esta é uma das principais causas da depressão que paralisa. Se não culpo ninguém por mais de um segundo, tenho sido autopunido há muito tempo.

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