Chico Xavier, uma lição de amor


Francisco Muniz


Ninguém morre. E quem quer que pense que a vida do médium mineiro Francisco Cândido Xavier chegou ao fim no último domingo, no mínimo está desinformado quanto às verdades da Vida. Maior expressão do Espiritismo em terras brasileiras, Chico Xavier começou aos quatro anos de idade a perceber a realidade da vida após a morte, quando, órfão de mãe e sofrendo a perseguição de sua madrinha, vivenciou os contatos com sua genitora desencarnada, que lhe pedia paciência ante o rigor do tratamento que lhe impunham. Treze anos depois, o jovem médium finalmente rendeu-se às evidências, que jamais refutara, e começou a se dedicar integralmente ao serviço com o Mundo Espiritual, dispondo-se a trabalhar com seu mentor, Emmanuel, e demais Espíritos Superiores, na tarefa de complementação doutrinária iniciada por Allan Kardec no século XIX.
Com Chico Xavier, a Doutrina Espírita, através dos livros ditados por Espíritos como André Luiz, que fora médico no Brasil e em livros como “Nosso Lar”, “Os Mensageiros” e “Missionários da Luz”, dentre muitos outros, enriqueceu-se sobremaneira e alcançou maior representatividade até mesmo no exterior. As obras recebidas do Plano Espiritual por Chico somaram 412 livros e já venderam pelo menos 25 milhões de exemplares, sendo traduzidas para vários idiomas. Esses livros retratam com fidelidade a natureza do Espiritismo, ciência filosófica de cunho moralizante que os Espíritos revelaram à Humanidade a partir do século XIX e que Allan Kardec – codinome do pedagogo francês Hippolyte Léon Denizard Rivail – codificou em cinco obras básicas: “O Livro dos Espíritos”, “O Livro dos Médiuns”, “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, “O Céu e o Inferno” e “A Gênese”.
Mas não é somente a produção literária psicográfica que dá expressão a Chico Xavier. Mais que isso, sua vida marcada por exemplos de abnegação é que o fazem ser reverenciado, desde sempre, como um verdadeiro apóstolo do Cristo, sob cujas ordens o médium servia aos Espíritos Superiores. Durante 75 anos – que se completariam no dia 8 deste mês -, Chico viveu exclusivamente para tornar seus dons mediúnicos um instrumento principalmente de consolo a milhares de pessoas angustiadas e inconsoláveis pelo que consideravam “perda” de entes queridos. Centenas de espíritos que partiram prematuramente, muitas vezes vítimas de acidentes e tragédias como o incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo, voltaram, através da psicografia de Chico, para confortar seus familiares, dizendo que tivessem confiança na bondade divina porque efetivamente a vida não acaba e aqueles que se separaram voltarão a estar juntos um dia.
A abnegação de Chico e seus exemplos de caridosa atividade em prol dos materialmente desafortunados se estendia além de seus dons mediúnicos. Os direitos autorais dos livros eram doados às editoras e a inúmeras entidades assistenciais, porque o médium entendia que não lhe pertenciam, uma vez que eram os Espíritos que escreviam e ela não passava de um instrumento - “imperfeito”, segundo dizia. Em Uberaba (MG), cidade que escolheu para viver por recomendação de Emmanuel, seu mentor, Chico tinha no Centro Espírita Casa da Prece a reedição da Casa do Caminho dos primeiros cristão e lá atendia diariamente centenas de pessoas carentes do corpo e da alma, às quais recebia pessoalmente, a despeito, muitas vezes, de suas condições de saúde.

Disciplina e humildade

Quase centenário, Chico Xavier preferiu desencarnar quando todos os brasileiros estivessem felizes e não por coincidência – que isso não existe num universo controlado por leis tão sábias quão perfeitas – o fato se deu no dia da conquista do pentacampeonato pela Seleção Brasileira de Futebol. Consta que Chico não quis ver o jogo, mas procurou saber do resultado. Algumas horas depois, enquanto o Brasil inteiro vibrava alegremente, o coração nonagenário do médium nascido em Pedro Leopoldo (MG) em abril de 1910 parava de bater, naturalmente, “sem aviso prévio”, como disse seu médico.
Esse comportamento ressalta o nível de humildade que caracteriza esse Espírito abnegado, que jamais quis elevar-se acima de ninguém, mesmo possuindo méritos para tal. Um dos muitos casos contados a respeito de sua vida plena de exemplificações benemerentes relata uma conversa com uma mulher que o procurara para informar-se quanto à reencarnação. Parece que ela havia se submetido a uma sessão de regressão de memória e assim tivera acesso a informe de alguma experiência anterior na Terra e confidenciou: “Chico, gostei de saber que eu fui uma dos cristãos sacrificados aos leões na velha Roma. E você?” Chico, mansamente, respondeu: “Ah, minha filha eu era a pulga do leão”.
Além da humildade, outra característica de Chico Xavier é a disciplina com que pautava sua atuação mediúnica e mesmo pessoal, em atenção às orientações de Emmanuel. Conforme relato do próprio Chico, quando seu mentor espiritual especificou-lhe a natureza e a importância do trabalho que desempenhariam juntos, impôs-lhe três condições: “Qual a primeira?”, quis saber Chico, ouvindo de Emmanuel a palavra “disciplina”. “E a segunda?” – “Disciplina”. “E a terceira?” – “Disciplina”. Desde então, Chico se tornou o homem que foi/é, o instrumento de que a Espiritualidade se serviu para espalhar na Terra a luz do esclarecimento de acordo com as propostas de libertação que o Espiritismo anuncia.

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